José Sarney é o político brasileiro que exerceu por mais tempo mandatos eletivos de nível nacional. Foram 12 anos como Deputado Federal, 4 anos como Governador, 5 anos como Presidente da República e 39 anos como Senador, estendendo-se ininterruptamente de 1955 a 2015. Esses 60 anos são mais do que o período em que D. Pedro II reinou (58 anos), que os senadores vitalícios do Império (o mais longevo foi Limpo de Abreu, 54 anos), que os deputados de muitos mandatos (o com mais mandatos — 12 — Manuel Novaes, ficou 44 anos), que os que atuaram no Império e na República (Ruy Barbosa somou 38 anos).
Deputado Federal
Presidente de entidades estudantis no Maranhão, redator e editorialista, José Sarney ganhou visibilidade e logo despertou a atenção dos partidos políticos da época. Em 1954, ano conturbado, devido ao suicídio de Getúlio Vargas, Sarney se candidatou a deputado federal pelo Partido Social Democrático (PSD).
Nessa primeira tentativa, sem dinheiro e sem tradição, conseguiu chegar a uma suplência, fato considerado uma vitória, já que sua primeira disputa era por um cargo federal, sem passar por postos estaduais. Ainda em 1955, aos 25 anos, teve a oportunidade de assumir provisoriamente o mandato de deputado federal. A estreia de Sarney como orador aconteceu em 16 de junho de 1955. Café Filho era o Presidente da República.
Chegou ao Palácio Tiradentes, antigo prédio do Congresso Nacional no Rio de Janeiro, com tanto entusiasmo e disposição para o trabalho que a interinidade se repetiu várias vezes. Para o jovem político, o Palácio Tiradentes representava o centro do mundo. Era ainda o parlamento do princípio do século, do discurso, da paixão, do talento e do duelo verbal. Sarney encontrou ali homens que eram alvo de sua admiração: Gustavo Capanema, Lúcio Bittencourt, Tristão da Cunha, Vieira de Melo, Artur Bernardes, Menotti del Picchia, Mário Palmério, Luís Viana Filho e outros mais.
Com a volta de Vitorino Freire para o PSD, Sarney, seu adversário, passou para a UDN, que tinha, então, uma das mais brilhantes bancadas que já passou pelo Congresso Nacional, liderada pelo que se chamou a “Banda de Música”: Aliomar Baleeiro, Adauto Lúcio Cardoso, Bilac Pinto, Prado Kelly, Afonso Arinos, Milton Campos, Pedro Aleixo… Afonso era o líder natural da bancada. Na reunião que definiu as lideranças para a sessão de 1957 indicou, com a aprovação da maioria, José Sarney para uma das vice-lideranças, como elemento de renovação.
Em outubro de 1955, Juscelino Kubitschek elegeu-se presidente do Brasil pelo PSD. Violentamente contestado por Lacerda, Juscelino conseguiu se estabilizar, superando a agitação militar que se seguiu à sua posse. A proposta de desenvolvimento, centrada na industrialização e na construção de Brasília, embora contaminada por diversos vícios do crescimento acelerado, trouxe um período de progresso raro na história do Brasil.
José Sarney tornou-se rapidamente figura conhecida da UDN e começou a ganhar prestígio nacional. O Rio de Janeiro era a capital e a sua condição intelectual ajudou-o a integrar-se no Congresso. Sem ter sido vereador, prefeito, deputado estadual, estágios que garantem bases municipais, mostrou aos políticos do Maranhão que poderia romper os obstáculos com que as oligarquias locais os mantinham isolados. Representando os mais jovens da bancada, passou a ser citado nos jornais e receber missões para acompanhar e discutir projetos nas comissões — e apartear discursos dos adversários.
O sucesso repercutiu fortemente no Maranhão. Os primeiros anos de mandato foram suficientes para que Sarney se impusesse como líder oposicionista e ganhasse, em 1958, lugar efetivo na bancada maranhense, sendo o mais votado na chapa da oposição.
Sua presença nacional se refletiu na política maranhense. Nas eleições de 58, comandou um bloco de oposição ao grupo de Vitorino Freire, a Oposição Coligada, que conquistou quatro das dez cadeiras da bancada maranhense na Câmara dos Deputados, sendo o mais votado da chapa. Com o mandato pleno e a efetiva liderança política no Maranhão, passou a ter acesso às deliberações partidárias.
No partido um homem fazia o espetáculo de massa: Carlos Lacerda. O grande tribuno tinha um jornal, que fazia as vezes de porta-voz da UDN, a Tribuna da Imprensa. Sarney frequentava sua redação e, com Aluísio Alves, Carlos Castello Branco, Odylo Costa, filho muitas vezes substituiu Carlos nos seus famosos editoriais.
Em 1959 Sarney lançou, com Edílson Távora e Ferro Costa, o grupo Bossa Nova, que pregava uma maior participação da questão social entre as bandeiras da UDN. Era a UDN de macacão. A eles se juntaram José Aparecido, Seixas Dória e vários outros. Contemporâneo das disputas pela candidatura presidencial, o Bossa Nova foi a grande marca da UDN naqueles dias.
Na convenção nacional que homologou a aliança com Jânio Quadros, foi decidido que o Bossa Nova teria uma vaga na comissão diretora. Assim, Sarney foi eleito vice-presidente da legenda em 1959.
Tendo feito oposição a Juscelino, Sarney foi líder de Jânio na Câmara dos Deputados. Os breves meses do Governo Jânio Quadros prometiam uma revolução no País, com uma nova postura internacional, uma reforma dos métodos políticos e a busca da Justiça social que era a bandeira do Bossa Nova. Mas o sonho durou pouco: como muitos outros presidentes ao longo da História, achou que o Congresso Nacional não era tão dócil quanto devia, e resolveu aplicar um auto-golpe: renunciar para voltar nos braços do povo. Não deu certo. Abalado embora pela reviravolta, Sarney foi contra a reforma constitucional que implantou o parlamentarismo como maneira de podar o mandato de João Goulart, que era o Vice-Presidente. Numa declaração de voto disse ser parlamentarista, mas acreditar que mudar o regime dessa maneira seria ruim para o sistema e um golpe contra Jango.
Em 1962, reeleito com facilidade, Sarney vê sua previsão de fracasso do parlamentarismo se confirmar. O ano é perdido com a campanha para a volta do presidencialismo, confirmada pelo plebiscito de janeiro de 1963. Ao mesmo tempo o País se divide na discussão das reformas de base, que todos sabiam necessárias, mas ninguém sabia quais eram. Abre-se uma crise gravíssima, com deterioração da economia e um paroxismo de enfrentamento político. 1964 começa com vários golpes anunciados. A dúvida é quem o dará primeiro: Leonel Brisola com as ligas camponesas, o próprio Jango, os grupos de direita ou os defensores da Constituição? Sarney é uma voz de ponderação.
Embora fazendo oposição a Jango, em março defende uma solução política para a crise que vai culminar com o golpe militar. Nos primeiros dias de abril de 1964 se opõe às primeiras cassações, sustentando a proteção constitucional dos mandatos, que só poderiam ser cassados pelo Congresso e seguindo o roteiro previsto na Constituição.
Ao final deste mandato Sarney foi eleito — em eleições diretas — Governador do Maranhão.
Senador pelo Maranhão
Em 1970, José Sarney entrou para o Senado Federal pela Aliança Renovadora Nacional (Arena), em 1970. No Congresso Nacional, buscou, com Daniel Krieger e outros senadores, a retomada das prerrogativas parlamentares.
Entusiasta de novas tecnologias, Sarney empenhou-se para a informatização do Senado e a criação do Instituto de Pesquisa e Assessoria do Congresso (IPEAC).
Foi o relator da Emenda Constitucional n.11 que, em 1978, revogou todos os atos institucionais do regime militar. Apontou, em seu parecer, que a emenda não acabava com o autoritarismo, mas representava o começo de um longo processo.
Reeleito senador em 1978, no ano seguinte Sarney passou a presidir seu partido. Com o fim do bipartidarismo e das duas legendas que o compunham, foi para o Partido Democrático Social (PDS), tornando-se seu primeiro presidente. Elaborou o programa do PDS com forte viés social.
Em junho de 1984, impedido de realizar prévias para escolha do candidato à sucessão presidencial, com a pressão do pré-candidato Paulo Maluf sobre o presidente Figueiredo, Sarney deixou o PDS. Criou, com dissidentes do partido, a Frente Liberal, que constituiu a Aliança Democrática com o Partido do Movimento Democrático Brasileiro(PMDB).
Para a eleição presidencial de 1985, ainda indireta, a Aliança lançou a chapa com Tancredo Neves para presidente e José Sarney para vice. Conseguiram imponente maioria no Colégio Eleitoral, com 480 votos, contra apenas 180 da chapa adversária, dentre os 686 delegados.
Senador pelo Amapá
Depois de deixar a Presidência da República, José Sarney foi eleito, em 1990, senador pelo Amapá. O ex-território federal acabara de ser elevado a Estado, e para lá mudara seu domicílio eleitoral. Durante o primeiro mandato conseguiu aprovar o Estatuto da Micro e Pequena Empresa e a Área de Livre Comércio de Macapá e Santana. Seu projeto de distribuição gratuita de medicamentos aos portadores de HIVtornou-se referência internacional.
Em 1998, Sarney conquistou mais um mandato, sendo reeleito senador pelo Amapá. Buscou levar àquele Estado as mesmas regras vigentes para o porto de Manaus. Durante esse mandato escreveu o livro Amapá, a Terra onde o Brasil Começa, onde conta a História do Amapá, apresentando documentos inéditos.
Sarney sempre deu grande importância às causas sociais. Sua defesa da discriminação positiva no sistema educacional brasileiro — foi de sua autoria a primeira proposta de cotas raciais apresentada ao Congresso, em 1999, que foi aprovada no Senado — acabou levando à sua implantação, por meio do Estatuto da Igualdade Racial. Seu projeto, entretanto, era mais abrangente, englobando concursos para cargos públicos em todas as esferas federativas, o Fies — Fundo de Financiamento ao Estudante do Ensino Superior (Fies) e determinando que no mínimo 20% das vagas fossem reservadas para pessoas negras.
Em desacordo com o PMDB, apoiou a candidatura de Lula à Presidência da República, em 2002. Em 2006, o Amapá, pela terceira vez, elegeu Sarney como seu representante no Senado.
Entre outras propostas, Sarney trabalhou pelo Plano de Desenvolvimento Regional dos Municípios do Entorno do Parque do Tumucumaque, e pela criação da Política Nacional do Livro e de um fundo nacional para dar assistência a vítimas de violência, outra de suas causas.
Ao longo do tempo em que presidiu a Casa, além dos problemas administrativos, Sarney continuou trabalhando como legislador e mantendo sua presença política, com discursos que marcaram época, como O Tempo de Crise, o Reforma Política e muitos outros. Defendeu a necessidade de transformação de nosso sistema de governo para o parlamentarismo e uma modificação profunda de nossas regras eleitorais, com a adoção do voto distrital misto.