Carlos Nejar•
Da Academia Brasileira de Letras. Em 10 de setembro 2007.
As teias da história e da arte
A Duquesa Vale uma Missa, de José Sarney, amplia sua dimensão romanesca, a partir do destino de um personagem problemático, complicado. Mais ainda com a morte e enterro do pai. Por meio de uma conjugação habilíssima entre história, erudição e conhecimento pictórico, veem à baila o rei Henrique IV e sua amante Gabrielle, entre injunções religiosas e políticas. De marcante originalidade. E o personagem que também faz parte do enredo é um Quadro, deixado no espólio de seu finado pai — o quadro da duquesa de Villars e de Gabrielle d’Estrées, pintado entre 1596 e 1610.
O romance consegue aliar as teias da história com as da arte do engano e da falsificação, prendendo o leitor na sabedoria de uma concisa construção ficcional, que não deixa de ser dramática e absorvente. E termina num delírio entre loucura e realidade, em que as últimas páginas são antológicas. O quadro foi o objeto, o móvel, o afluente das paixões e é por fim assassinado. Nesse entrecho surgem os mistérios de uma família e da nação. Leonardo é impulsor e vítima da própria demência. O livro emociona. Trata-se de criação extraordinária, que destaca seu autor, mais uma vez, entre os nossos maiores romancistas.