Em casa, na solidão em que me encontro do Covid-19, chega uma notícia que me traz nostalgia. Cem anos do nascimento de Elizeth Cardoso, a grande cantora, a Divina, dos meus tempos de moço. A conheci no Rio de Janeiro, deputado federal, em 1955. Ela cantava numa casa de show, aonde fui levado pelo nosso sempre saudoso e inesquecível Henrique de La Rocque, de quem ela era amiga. Quando terminou o espetáculo La Rocque levou-a para tomarmos um drink.
O Rio de Janeiro, como disse Hemingway de Paris, era uma festa. Respirava alegria e cultura, surgiam grandes revelações da música popular e os suplementos literários dos jornais acolhiam talentos novos e novos movimentos. Pelas mãos bondosas de Odylo Costa, filho, que dirigia o Jornal do Brasil e tinha em sua casa o último dos grandes salões literários do Rio de Janeiro, conheci nessa época Manuel Bandeira, de quem tornei-me amigo, Afonso Arinos, meu padrinho político, Drummond, Guimarães Rosa, Pedro Nava, Eneida, Peregrino Júnior, José Olympio, Raquel de Queiroz, Rubem Fonseca, João Cabral e, por extensão, o Brigadeiro Eduardo Gomes, Odilon Braga e todos os meus ídolos da UDN.
E por artes do destino, ampliei esse ciclo de amizades com o pessoal da música, através de um dos maiores talentos dessa área, compositor, radialista, jornalista e poeta, Miguel Gustavo, um dos maiores talentos que conheci, para fazer um jingle para minha campanha política de 1962. Ele dominava o meio artístico compondo obras que se tornavam logo grande sucesso, marchinhas carnavalescas como a Dança da Boneca, a Fanzocas do Rádio, jingles publicitários, como os Porquinhos da Casa da Banha. Seus jingles eram admiráveis. Foi pioneiro e genial nessa arte. Foi o autor do Jangar, “É Jango é Jango Goulart”, que ficou como responsável da vitória de João Goulart sobre Milton Campos.
Essa amizade me levou a conhecer o meio artístico, inclusive o pessoal do Cinema Novo e da Bossa Nova. Incorporei a essas amizades Luís Carlos Barreto, Glauber Rocha, Paulo César Saraceni e sua mulher, a atriz de cinema e novela Ana Maria Nascimento e Silva, o Nelson Pereira dos Santos, o Cacá Diegues, depois meus colegas na ABL.
Miguel Gustavo tornou-se meu estreito amigo. Fez o Baião do Sarney, Meu voto é minha Lei, o Hino do Maranhão Novo e deu-me na campanha um disco inovador, com um conjunto de grandes cantores apoiando minha candidatura: Elizeth Cardoso, Elza Soares, àquela época a mais popular cantora do Brasil, Luís Vieira, Altamiro Carrilho, Carequinha, cantor das crianças.
Aí reeencontrei Elizeth, pessoa educadíssima, elegante e que transformou-se em minha amiga.
Agora, durante a pandemia do Coronavírus, passaram esta semana os trinta anos de sua morte, antecipando o seu centenário, em julho. Lembrei-me desse belo tempo, das minhas amigas e amigos do Rio e do Palácio Tiradentes, e recordo com gratidão Elizeth Cardoso, que participou assim da minha campanha para Governador. Nada pago, tudo amizade e generosidade. Tempos bons.
É uma mistura de saudade e nostalgia. A vida começando e lembranças e sonhos de momentos que ficaram eternos.