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Gerard de Cortanze: sobre “O Dono do Mar”

Gerard de Cortanze: sobre “O Dono do Mar”

Gerard de Cortanze•

Escritor, ensaísta, tradutor e crítico literário. “Magazine Littéraire - Paris”, número 363, março de 1998.

 

Homenagem às gentes do mar

O mar do Maranhão, no Norte do Brasil, é um cenário cheio de mistérios. Ao longo de um litoral muito recortado, muitas águas embaralham suas correntes. Ao longo de suas baías ricas de uma fauna e uma flora luxuriantes, bancos de areia, canais, manguezais, atóis, barreiras de coral, baixios constituem um universo geográfico onde nascem e se propagam as lendas mais singulares. Há muitas gerações os pescadores desta zona setentrional do Brasil, nas margens de suas bianas e de seus igarités, reencontram um oceano eternamente recomeçado.

O livro de José Sarney, político célebre em seu país, onde chegou às mais altas funções de Estado em 1985, que soube sempre conduzir paralelamente sua carreira pública e suas atividades literárias, é, antes de mais nada, uma soberba homenagem às gentes do mar. Faz-nos pensar em Hemingway, nem tanto no O Velho e o Mar, mas sobretudo nos artigos que consagra aos humildes pescadores de Cojimar, pequeno porto próximo a Havana. Faz-nos lembrar também certos trechos de Álvaro Mutis. Como se José Sarney pegasse de cada um o melhor: um certo realismo poético emanando do primeiro, a mística marítima do segundo.

Cristório, seu herói, O Dono do Mar, navega nas águas do Golfão maranhense desde os seis anos. Conhece todos seus esconderijos, todas as suas passagens, todas as suas armadilhas, todas as suas lendas. Neste Styx, renovado a cada dia, ele singra, a bordo de sua canoa Chita Verde, aquilo que Vico chama de futuro do passado: o mundo das lendas, aquele dos homens e de seus fantasmas, de seus sofrimentos e suas alegrias.

Antão Cristório, velho pescador do mar infinito, entre as águas de Deus e as correntes do diabo, perde-se e reencontra-se, parte à procura de todas as naus de todos os marinheiros do mundo, com eles marca encontro nesses portos, que tão bem conhece, para que aí venham conversar entre marinheiros, sobre a vida e a morte, sobre o real que tão frequentemente desliza para o sonho. Antão Cristório é um homem da nostalgia e do comércio com as noites, um contador de seus próprios feitos que têm um gosto de simplicidade. Antão Cristório é um homem que busca perdidamente o seu destino.

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