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Instalação da Assembleia Nacional Constituinte

Instalação da Assembleia Nacional Constituinte

Cadeia nacional de rádio e televisão, 31 de janeiro de 1987

Brasileiras e brasileiros, boa noite.

Estamos chegando à grande data de instalação da Assembleia Nacional Constituinte, que será um marco histórico no avanço democrático do Brasil.

Nossos antepassados tentaram algumas vezes estabelecer uma Constituição duradoura. Assim foi no Império, assim também na República. Estas Constituições não alcançaram esse ideal de permanência e foram incapazes de sobreviver ao tempo, de arbitrar crises, de oferecer caminhos. 

A história do Brasil, a difícil história do Brasil, está cheia de frustrações institucionais. Daí as responsabilidades dos constituintes de hoje, os constituintes de 1987. Eles estão realizando uma obra para o futuro, para durar, com a missão mais alta de elaborar um documento sagrado, como foi a Carta do Rei João, para a Inglaterra, ou a Constituição americana, que já atravessa dois séculos.

Uma Constituição consagra sempre o governo da lei e não dos homens. Nós todos passaremos. Mas a Constituição deve ser feita para sobreviver a todos nós, gerações e gerações. Para isso ela tem de ser sábia, abrir o Futuro, desvendar os caminhos do amanhã.

Fui o autor da mensagem que convocou a Constituinte. Cumpri os compromissos da Aliança Democrática e honrei o legado de Tancredo Neves, legado que é inspiração e que é a força em todos os nossos instantes. Foi um ato de fé e um ato de coragem no Brasil porque significa coragem para mudar.

Vamos fazer um pequeno retrospecto.

Com a participação decisiva do Congresso Nacional, nós legalizamos os partidos chamados clandestinos. Não só eles foram legalizados, como pessoalmente eu empenhei minha autoridade e minha vontade para evitar qualquer discriminação ideológica de pessoas. Reformamos toda a legislação partidária e eleitoral. Fizemos o recadastramento e realizamos eleições diretas para as capitais, realizamos eleições para todos os municípios de segurança nacional. Foram suspensas as intervenções em organizações sindicais, reconhecidas as centrais de trabalhadores. Criamos organismos de participação que hoje representam a presença permanente dos trabalhadores brasileiros que hoje ocupam cargos em diversos conselhos, órgãos de decisão do governo, opinando e defendendo suas causas. Fortificamos a prática de uma democracia participativa, incentivando as associações de bairros, de segmentos sociais, associações religiosas, operárias e patronais.

Finalmente, no ano passado, foram realizadas as eleições para governadores, deputados e senadores, as maiores e mais livres eleições da história brasileira.

Sem faltar com o meu dever de lealdade e solidariedade aos meus companheiros políticos, eu mantive a autoridade do governo, e ninguém, nenhuma corrente ou partido, sofreu qualquer cerceamento, coação ou ameaça por divergir ou ser contra o Governo.

A democracia aí está no Brasil inteiro, vigorosa, participativa. Respira-se liberdade em todos os cantos do Brasil.

É este o País que os deputados e senadores constituintes recebem.

Nunca, nunca uma Constituinte se reuniu com tanta participação, legitimidade, paz e estabilidade política, com um governo constituído e plenamente aceito, com tão amplas e totais garantias, livre de ameaças internas e externas ou de desestabilizações pela força.

Quanto à nossa Assembleia Constituinte que amanhã se instala, tenho certeza que os nossos constituintes, competentes, eleitos em grande disputa, afirmando suas lideranças, manterão este Brasil pacificado, organizado, para ter uma Constituição moderna, justa, democrática, com liberdade de iniciativa e liberdade política, e direitos sociais que assegurem aos mais pobres uma vida digna, base para estabilidade nacional.

Não posso deixar de dizer que se por um lado os nossos ganhos políticos são extraordinários, por outro nós também atravessamos momento de grandes dificuldades, momento que vai exigir compreensão do povo brasileiro.

O Plano Cruzado foi e é um grande êxito. Vamos completar um ano do Plano Cruzado em 28 de fevereiro. E nesse ano o Brasil foi o país que mais cresceu no mundo ocidental, o ano em que o desemprego esteve mais baixo. Criamos mais de um milhão de novos empregos.

Os trabalhadores tiveram ganhos reais. Foi feita a maior revolução social da História do Brasil com a maior redistribuição de renda, com crescimento econômico e sem recessão. O País encontrou seu caminho, fizemos escolhas de prioridades e saímos daquele dilema clássico inflação/recessão.

Os nossos programas alcançam milhões e milhões de brasileiros através dos planos de ação comunitária que vão desde a distribuição de leite, creches, alimentos, até a construção de moradias, centros de saúde e escola.

Internacionalmente, o nosso Brasil passou a ter um grande lugar de destaque, respeito e força.

Na América Latina nós tivemos a coragem de iniciar uma política de integração aberta e descomprometida.

Vivemos um tempo de transformações.

Mas, devo repetir, temos problemas, e grandes problemas. E qual o país do mundo que não tem problemas? Se as nossas metas, como as da área econômica, ainda não foram alcançadas, ninguém mais do que eu sofre com isso. Mas isso não nos faz recuar. Não me intimidam pressões passageiras de grupos ou facções voltadas para interesses egoístas. Eu tenho certeza que nós venceremos todas as dificuldades. Sei que não vai ser fácil, não tem sido fácil. Mas espero contar, como tenho contado, com a compreensão das brasileiras e dos brasileiros.

Desde o primeiro dia do meu governo, tenho procurado estabelecer uma política de consenso, de paz nacional, de conciliação, como é do meu temperamento. O pacto social é o que tentamos agora e tentamos sempre. Talvez nos falte ainda o hábito das negociações econômicas internas. Porque é difícil compor interesses divergentes. A estratégia do governo para promover essas negociações foi e será sempre a de dizer a verdade. E esse é o caminho que deve ser seguido e que deve ser explorado.

Nunca as nossas diretrizes foram tão firmes. Elas se resumem no seguinte: crescimento liderado pela iniciativa privada, com distribuição de renda. E uma irreversível, convicta, justa e humana opção pelos pobres.

Tenho cumprido todos os compromissos. E vou cumprir.

A nação inteira é testemunha do meu esforço, da minha obstinação, da minha dedicação para resolver problemas que eu não criei e que eu encontrei de uma maneira dramática.

Amanhã a Nova República resgata o seu maior compromisso institucional. Saudemos, portanto, a Assembleia Nacional Constituinte! 

Desejo aos constituintes de todos os partidos — não me importam as ideias que defendam e as simpatias que alimentam — que façam a melhor Constituição, um documento à altura de possa grandeza. O Brasil merece, o povo está esperando, o Brasil está pronto para isso.

A Constituinte, durante seu funcionamento, deve ser um instrumento de estabilidade política. E de mãos dadas com o Governo, através do Congresso Nacional, principalmente os nossos companheiros, ela será um esteio solidário para vencermos obstáculos e continuarmos as mudanças.

A retórica da Nova República não é a retórica do desastre.

A Nova República tem uma obra realizada e tem uma obra a realizar.

Há no chão do Brasil o vigor dos grandes destinos.

Vou continuar a pregar sempre com a mesma determinação, com a mesma coragem, com a mesma convicção nesse caminho. Plantemos esperanças e flores porque tem que dar certo.

José Sarney foi Presidente do Brasil, Presidente do Senado Federal, Governador do Maranhão, Senador pelo Maranhão e pelo Amapá e Deputado Federal. É o político mais longevo da História do Brasil, com mais de 60 anos de mandatos. É autor de 122 livros com 172 edições, decano da Academia Brasileira de Letras e membro de várias outras academias.

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