O Papa Francisco, no dia 13 de maio, reconheceu mais um milagre de Irmã Dulce. O Cardeal Angelo Becciu, Prefeito da Congregação da Causa dos Santos, publicará o decreto de canonização para que, no Consistório convocado para o dia 1º de julho, em cerimônia solene, seja proclamada Santa. Santa Irmã Dulce dos Pobres.
Frágil como uma pétala, débil como uma folha levada ao vento, mas plena de bondade, lutando até para respirar, lutando sempre pela sua grande causa, que era a causa dos pobres. Foi essa a Santa que eu conheci.
Os santos buscam a santidade, seja diretamente, como Santa Terezinha, seja indiretamente, como São Francisco de Assis — para usar exemplos caros à Irmã Dulce. Essa via é um caminho de sacrifício, e Deus os põe à prova.
Irmã Dulce nos deu o exemplo da caridade e da virtude esquecida. A sociedade capitalista gera valores materiais e negligencia os valores espirituais. Irmã Dulce era uma tocha permanente, que brilhava para lembrar que não podemos ficar, somente, no usufruto dos nossos bens, sem pensar no universo que nos rodeia, nos miseráveis, nos pobres, nos deserdados.
Nunca deixou, nunca abandonou a sua fé. Jamais se deixou envolver por qualquer outro chamamento de natureza política, ou de natureza material, ou de qualquer outra natureza. Ela sempre foi o que ela é: santa.
Ela era o cristianismo sem adjetivos, era uma esmoler dos doentes. Essa mulher era uma força da sua fé.
O grande amor de Deus fez com que, no Brasil, tenha nascido e vivido criatura tão boa, das melhores almas da Humanidade.
Irmã Dulce era uma flor de amor e de bondade, esse desejo de ser um pedaço de Deus nas ruas de Salvador da Bahia. Santa como os profetas.
Eu tinha conhecimento da obra social de Irmã Dulce. Sabia da verdadeira abnegação dessa alma inigualável. A comunhão do nosso espírito consolidou-se quando a conheci pessoalmente, em Salvador. Vi, então, como dizem os clássicos, “de olhos vistos”, a ação de uma mulher de físico frágil, a conduzir com espírito gigantesco uma das obras mais delicadas a que um ser humano pode se dedicar — a integral, gratuita e despojada de vaidades ajuda ao irmão pobre e despossuído.
Visitei-a sempre, algumas vezes no anonimato. Vi seu sofrimento e, ainda hoje, me recordo com que emoção, poucos dias antes de ela falecer, tive a oportunidade de, olhando-a naquele sofrimento, no que não era cama — o seu leito era quase uma cadeira —, para lhe prestar uma homenagem, lhe dizer:
“Seu devoto, não posso fazer outra coisa, senão de beijar-lhe os pés.”
E beijei os pés de Irmã Dulce, ajoelhado.
A amizade que tínhamos um pelo outro era nutrida de nossos sentimentos comuns de amor próximo e só fez se consolidar com o passar dos anos, em benefício maior da parte que me toca, visto que a minha alma se engrandece na memória de alguém tão pura, como enriquecia, ontem, no convívio com uma pessoa tão abnegada ao próximo.
Maria Rita, sua sobrinha, no momento do seu sepultamento, entregou-me a bandeira do Brasil que cobria seu caixão. Levei-a para a Fundação da Memória Republicana Brasileira, onde está exposta, relíquia que depositei junto ao povo maranhense.
Em 1988, indiquei nossa Irmã Dulce para o Prêmio Nobel da Paz. Não estava somente atestando preferência e escolha pessoais, eu expressava o que habitava no fundo da alma brasileira. Irmã Dulce era um símbolo, plena de bondade, as pequeninas mãos carregando tão pesado fardo, como seja a prática da caridade e do amor, lutando pela paz do corpo e rezando pela salvação do espírito. Era um anjo de bondade pousado em terras da Bahia.
Exemplo mundial de caridade, serviu Irmã Dulce com sua vida para o alívio do sofrimento dos mais pobres entre os mais pobres. Débil de saúde, mas muito forte de alma, deu um exemplo extraordinário de bondade e fé com suas obras sociais, sua projeção humana no Brasil inteiro. Tinha a paz cristã, a grande paz da vida dedicada ao próximo e aos mais necessitados.
Visitei-a quando se encontrava em seu leito de agonia. Impressionou-me seu semblante sereno, que transmitia uma grande paz interior de quem — mais do que se voltava para os braços do Criador — levava a consciência tranquila de ter sido cristã, de amar e de servir ao próximo.
Quantas vezes eu ouvi Maria Rita, essa mulher de força e dedicação, dizer-me que o Vaticano pedia mais um milagre da Irmã Dulce e eu respondia: eu sou testemunha, ela já me fez mil milagres. Ao deixar o governo, eu ia sair, ia descer a rampa, numa situação difícil. Então, antes de sair, reuni minha família, minha mulher, meus filhos e não sei por que coloquei um lenço no bolso para as lágrimas.
E disse a todos que estavam ali: “Olhem, vocês se preparem. Eu cumpri com o meu dever, fiz tudo o que eu podia fazer. Agora, vou descer a rampa do Palácio” — na frente, havia uma multidão incalculável. “Metade vem para aplaudir o candidato que vai tomar posse, a outra metade vem para vaiar o candidato que vai tomar posse, mas todas as duas correntes vêm para me vaiar.” Peguei na mão da minha mulher e dos meus filhos e desci a rampa.
Não sei por que, ao descer, senti ao meu lado alguém. Olhei, procurava quem estava ali, e era a Irmã Dulce. Tirei o lenço e, então, sacudi o lenço como quem se despedia. E aí, de repente, aquela multidão, de um lado e de outro, que devia me vaiar, começou a aplaudir-me. Vi as pessoas chorarem. E eu me dizia: é milagre da Irmã Dulce!
Agora, a Igreja reconhece um milagre especial: um homem de 50 anos, há 14 anos cego, sentindo dores fortes, rezou a Irmã Dulce, adormeceu, e amanheceu vendo. Os exames médicos afirmam: ele continua cego; mas, pela intercessão de Irmã Dulce, vê.
Santa Irmã Dulce, rogai por nós.