Sempre tive uma boa memória. Quando falha fico preocupado. Pois não é que esta semana ela me fez uma que quase me leva ao pânico? Felizmente para lembrar tive a ajuda de Tereza Cruvinel, brilhante jornalista a quem nos ligam laços de afeição desde que ela chegou a Brasília. Era o dia 15 destes idos de março. Eu curtindo uma dor lombar destas que nos levam a só pensar em analgésico. O telefone toca. Atendo. Era Tereza, com toda a sua delicadeza a parabenizar-me: — “Sarney, depois de outros que Continue a ler
Estarrecido, o Brasil assistiu, no domingo, ao primeiro ataque simultâneo aos Três Poderes. Nossa História tem alguns episódios de ataques a um ou outro Poder, em geral durante os golpes — ou tentativas de golpe — de Estado que marcam nosso caminho para a estabilidade democrática. Nunca, no entanto, houve qualquer movimento que se parecesse com a selvageria do bando de arruaceiros que atingiu agora o Congresso Nacional, o Palácio do Planalto e o Supremo Tribunal Federal. A Assembleia Constituinte e Legislativa de 1823 foi fechada por militares a mando Continue a ler
A questão da legitimidade do mandato nos cargos executivos é velha como a República. A Constituição de 1891 definia, em seu artigo 47, que “o presidente e o vice-presidente da República serão eleitos por sufrágio direto da Nação, e maioria absoluta de votos”. Sabemos que logo foram adotadas as providências para que isso acontecesse: Prudente de Moraes foi eleito com 88% dos votos; Campos Sales, com 91%; Rodrigues Alves, com 93%; Afonso Pena, com 98%; o Marechal Hermes da Fonseca, com 65% — Rui Barbosa teve a maior votação de Continue a ler
Alexis de Tocqueville, em sua clássica e famosa obra, “A Democracia Americana”, que já caminha para dois séculos de sua primeira edição (1835), fez a apologia do regime praticado nos Estados Unidos, único no mundo com suas características, até então, e disse de suas grandes e inovadoras virtudes. Tão boas que essas instituições se espalharam no mundo inteiro, inclusive no Brasil, onde a República, sob a inspiração de Rui Barbosa, moldou a Constituição de 1891 com o domínio das ideias civilistas dos direitos individuais e do poder político, síntese de Continue a ler
Ranieri Mazzilli, deputado pelo PSD de São Paulo, foi, durante muitos anos, presidente da Câmara. Tinha um aspecto de lutador de boxe ou barítono, com uma envergadura muito grande, e falava com certo ar de autoridade, o que lhe dava o respeito dos seus colegas e, ao mesmo tempo, condições para dirigir os trabalhos com muita competência. Quando veio a Revolução de 64, o Presidente Castello pediu-lhe, e à sua Bancada na Câmara, que apoiassem o nome do Deputado Bilac Pinto para substituí-lo, uma vez que já ocupava o cargo Continue a ler
Assumi a Presidência da República em março de 1985. Meu espaço para deflagrar minhas próprias ideias era muito estreito. Não tinha partido político. Minha filiação ao PMDB era uma exigência legal. Minha base política era a dissidência que me acompanhara vinda do PDS, tendo à frente o grande homem público, exemplo de austeridade e patriotismo, Aureliano Chaves, junto de Jorge Bornhausen, Marcos Maciel, Guilherme Palmeira e outras lideranças. Eu vinha de um Estado sem peso político, o Maranhão, sem ligação com a grande mídia, sem apoio de corporações econômicas e Continue a ler
As causas da raça negra e da cultura foram as duas maiores preocupações minhas em 12 anos de Câmara dos Deputados e 40 de Senado. Sou o Senador que mais tempo exerceu mandatos naquela Casa. E o político mais longevo da República, com mais de 60 anos de atividade e ainda presente — sem militância partidária, mas Presidente de Honra do MDB, partido a que sou filiado há 36 anos. Exerci por oito anos a Presidência do Senado Federal. Sempre discordei da maneira como o problema da raça negra era tratado. Continue a ler
Durante o meu governo, na elaboração do Plano Verão, trouxeram-me o esboço dos cortes que pensavam que devíamos fazer: a primeira coisa que ali estava era a extinção do Ministério da Cultura, por mim criado no dia em que assumi a Presidência da República, 15 de março de 1985. Quando li, minha primeira reação foi uma pergunta indignada: “Os senhores ou querem me ofender ou não conhecem a minha carreira parlamentar. Pois saibam que minha causa parlamentar foi a cultura, fiz dezenas de discursos e apresentei vários projetos de lei Continue a ler
O poder e a caneta têm uma relação íntima, às vezes libertina. Mas ultimamente ela tem sido explícita. A primeira vez que ouvi uma definição precisa sobre essa relação foi, nos longínquos anos de 1968, de Plácido Castelo, ele governador do Ceará, eu do Maranhão. Disse-me, mostrando uma caneta: “Sarney, nós, governadores, com esta bichinha poderosa, podemos fazer a felicidade e a infelicidade, nomear, demitir e ameaçar. Mas ela tem um defeito. Quanto acaba a tinta, não serve para mais nada.” A tinta acabava com a eleição do sucessor. A Continue a ler
Meus olhos se abriram para o mundo às 7,30 horas de uma cinza manhã de abril, de 1930, depois de noite de um parto sofrido — minha mãe primípara, quase uma menina de 18 anos —, numa casa de chão batido, de 55 metros quadrados, na ainda pequena, quase uma vila, Pinheiro, onde tínhamos chegado há trinta dias, terra cercada dos mais belos campos do mundo, de capins verdes e flores amarelas formando um tapete no meio das águas do Pericumã, saídas do seu leito pelo mundão das chuvas do Continue a ler
Senado Federal, Brasília, DF, 2 de março de 2006 Ocupo a tribuna nesta tarde para recordar que no dia 28 de fevereiro de 1986, portanto há 20 anos, foi editado o Plano Cruzado, que considero uma das mais importantes e corajosas medidas tomadas no Brasil para proteger os pobres e o povo brasileiro. Quando assumi a Presidência, a nossa economia estava numa situação extremamente difícil. Recebemos um deficit de 60% do nosso orçamento. Hoje, fala-se num deficit de 4% e até de superavit. Pode-se, então, avaliar o que era. A Continue a ler
Congresso Nacional, Brasília, DF, 15 de fevereiro de 1990 Senhores Congressistas, Envio ao Congresso Nacional a última mensagem do meu mandato. Renovo, mais uma vez, minha homenagem a esta instituição, coração e alma do sistema democrático. Lanço os olhos no tempo. Recordo a manhã de 15 de março de 1985. Com a doença, e depois a morte de Tancredo Neves, coube-me dirigir a Nação no seu período mais difícil, porque mais cheio de cobranças políticas, em toda a nossa História. Somavam-se esperanças e dificuldades. As liberdades, até então represadas, explodiam Continue a ler
Palácio do Planalto, Brasília, 15 de março de 1985 As nações, como os homens que a constituem, são imperfeitas construções da História. Não há povos — nem homens — servidos apenas de virtudes, nem aqueles submissos inteiramente aos pecados. Mas ao mesmo tempo as nações, como os homens, carregam em si, com suas imperfeições, a busca do ideal e da perfeição, procurando recuperar os caminhos que tenham sido perdidos nas tardes da aventura e nas noites do medo. É, pois, sinal do homem, assim como das nações, a ânsia da Continue a ler
Palácio do Planalto, Brasília, 15 de março de 1985 Eu estou com os olhos de ontem. E ainda prisioneiro de uma emoção que não se esgota. O Deus da minha fé, que me guardou a vida, quis que eu presidisse a esta solenidade. Ele não me teria trazido de tão longe, se não me desse também, na sua bondade, as virtudes da paciência, do equilíbrio, da coragem, do idealismo, da firmeza e da visão maior das nossas responsabilidades perante esta Nação e sua história. Na forma da Constituição Federal assumi Continue a ler
Diamantina, MG, 12 de setembro de 2005 Vejo Diamantina com os olhos de quem a conhece de muitas vezes, tempos e anos, fascinado com o conhecimento de sua história, revivendo a paisagem dos seus faiscadores e pioneiros, caminhantes da Estrada Real, no sonho das pedras feitas do brilho do sol, com a sua poderosa cultura popular, o encanto dos sons de suas modinhas. Diamantina!, meus olhos a veem no símbolo de sua dimensão eterna para Minas e para o Brasil. São lembranças culturais de livros e referências, mas, também, do Continue a ler
Senado Federal, Brasília, DF, 3 de março de 2010 Neste 4 de março faria 100 anos um dos maiores homens públicos da História do Brasil: Tancredo Neves. O tempo se comporta em relação aos grandes homens de maneira contraditória. Por um lado lança sobre ele as névoas e as garoas da memória, tornan- do menos viva a sua presença. Por outro lado nos permite uma visão perspectiva do passado, tornando mais contrastadas as grandes figuras que sobrevivem e sobreviverão ao seu tempo. Podemos hoje ter uma visão muito mais definida Continue a ler
Senado Federal, Brasília, DF, 18 de dezembro de 2014 Último discurso parlamentar. Sr. Presidente, Mozarildo Cavalcanti, que tenho grande prazer de ver presidindo esta sessão; Senador Anibal Diniz, a quem quero agradecer também a gentileza de ter me cedido esta precedência; Srªs e Srs. Senadores; ouvintes da TV Senado; eu quero dizer que esta é a última vez que ocupo a tribuna parlamentar, que frequentei desde 1955. Eu sou meio supersticioso e avesso às despedidas e não gosto de dizer adeus, mas não posso fugir ao dever e sentimento da Continue a ler
Funerais do Presidente Raúl Alfonsín, Buenos Aires, Argentina, 1o de abril de 2009 Volto à Argentina, este país pelo qual tenho tanta admiração, carinho e apreço, de que tanto gosto, pela sua história, pela sua tradição e pelo seu povo. Desta vez, num momento triste, em que cumpro deveres de Estado, mas muito mais do que isto, os deveres da amizade. Aqui estou como representante pessoal do Presidente Lula, chefiando a delegação do Brasil integrada também por Samuel Guimarães, Ministro interino das Relações Exteriores, e por Mauro Vieira, Embaixador do Continue a ler
Celebramos no dia 1º de julho os 25 anos do Real, a moeda criada pelo bem-sucedido plano para baixar a inflação brasileira a níveis que permitem aos agentes econômicos a previsibilidade orçamentária, pilar da economia de mercado. Quando, em 1985, assumi a presidência da República, herdei uma forte inflação, provocada, em grande parte, pela combinação de preços do petróleo, descontrole da dívida externa e conjuntura das taxas internacionais Libore prime rate— que se mantiveram muito altas no meu governo, chegando a 9,3 e 10,9 (naqueles anos, descontada a inflação, as taxas chegaram Continue a ler
Discurso proferido em Sessão Solene do Senado Federal no dia 15 de março de 2005 Sr. Presidente do Senado, Senador Renan Calheiros; Sr. Presidente do Supremo Tribunal Federal, Ministro Nelson Jobim; Sr. Governador de Minas Gerais, Aécio Neves; Sr. Ministro da Articulação Política, Aldo Rebelo; Sr. Vice-Presidente da Casa, Senador Tião Viana; Sr. Senador João Alberto; Sr. Senador representante da Paraíba, Efraim Morais; Srªs e Srs. Senadores; Srs. Ministros de Estado; ilustres Ministros do meu governo que tiveram a bondade de aqui comparecer; auxiliares que, comigo, àquele tempo, trabalharam Continue a ler