Todo homem, por força de sua condição social, é necessariamente um político, tanto por querer influir na comunidade a que pertence quanto por defender essa comunidade. Ninguém se dissocia desse modo de ser, tão antigo quanto o próprio homem. É consubstancial à natureza humana.
A ordenação política é uma luta permanente entre duas tendências: a tendência que leva à ordem, pela disciplina autoritária e vigilante, e a disciplina que freqüentemente se rompe, para que o processo social se revitalize, buscando formas de existência e afirmação. Uma, restringe a liberdade; a outra tende a ser caudal que abre a barragem e inunda o chão em seu redor.
A melhor solução é a conciliação da disciplina com a liberdade. Com a liberdade de romper a sociedade organizada, pela sincronia dos opostos, sem prejuízo da plenitude da liberdade – a liberdade de opinião, da renovação, da proposta, da experiência válida, em consonância com as aspirações nacionais.
Diz-me a experiência que ninguém deve aspirar ao pleno exercício da atividade política sem levar em conta estes dois elementos básicos: a palavra enunciada, para conduzir o processo social, e o silêncio acolhedor, para recolher a opinião e a advertência, que se incorporam aos instrumentos desse processo, como afluentes do grande rio.
Discurso na Academia Brasileira de Letras — 2/7/1985