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A Coluna do Sarney

A fome vem de longe

A história do alimento é a história do próprio homem. A primeira demanda que o homem tem para viver é justamente a de comer. A segunda é a de manter-se em segurança. Sem ela, ele não come, como também não tem direito à habitação, à vestimenta, que são os dados fundamentais do princípio da vida. Agora vejo na mídia que o problema da fome voltou a ser alvo de preocupações muito grandes. O Presidente Lula, desde que assumiu a Presidência pela primeira vez, se preocupou com esse problema e já Continue a ler

A fome vem de longe

      A história do alimento é a história do próprio homem. A primeira demanda que o homem tem para viver é justamente a de comer. A segunda é a de manter-se em segurança. Sem ela, ele não come, como também não tem direito à habitação, à vestimenta, que são os dados fundamentais do princípio da vida. Agora vejo na mídia que o problema da fome voltou a ser alvo de preocupações muito grandes. O Presidente Lula, desde que assumiu a Presidência pela primeira vez, se preocupou com esse Continue a ler

O Passado no Presente

Ontem, nos 64 anos de Brasília, dei uma entrevista muito pessoal sobre a minha história com a cidade em que estou mais da metade da minha vida, desde a sua fundação. Hoje talvez seja, entre os poucos que vieram para esta capital, o mais velho dos deputados da transferência do Rio para Brasília que ainda sobrevivem. Nunca consegui libertar-me das lembranças do que foi vir morar aqui naquele ano de 1960, senão que era aventura e sonho. Aventura da mudança com o caos das construções e o sentimento de que Continue a ler

O Passado no Presente

Ontem, nos 64 anos de Brasília, dei uma entrevista muito pessoal sobre a minha história com a cidade em que estou mais da metade da minha vida, desde a sua fundação. Hoje talvez seja, entre os poucos que vieram para esta capital, o mais velho dos deputados da transferência do Rio para Brasília que ainda sobrevivem. Nunca consegui libertar-me das lembranças do que foi vir morar aqui naquele ano de 1960, senão que era aventura e sonho. Aventura da mudança com o caos das construções e o sentimento de que Continue a ler

Ataque inútil

O mundo está assistindo — perplexo e, ao mesmo tempo, temeroso das consequências que podem ser geradas — a guerras localizadas no Oriente Médio. A maior e a raiz de todas elas: a luta de Israel contra os países árabes. Vimos, ontem à noite, o que foi proporcionado pela televisão: nos céus de Israel, mísseis iranianos e o escudo de ferro israelense em enfrentamento. Sem dúvida, é uma irresponsabilidade essa atitude do Irã de atacar o território israelense, porque isso não se enquadra em represália nem com a cobertura dos Continue a ler

Ataque inútil

O mundo está assistindo — perplexo e, ao mesmo tempo, temeroso das consequências que podem ser geradas — a guerras localizadas no Oriente Médio. A maior e a raiz de todas elas: a luta de Israel contra os países árabes. Vimos, ontem à noite, o que foi proporcionado pela televisão: nos céus de Israel, mísseis iranianos e o escudo de ferro israelense em enfrentamento. Sem dúvida, é uma irresponsabilidade essa atitude do Irã de atacar o território israelense, porque isso não se enquadra em represália nem com a cobertura dos Continue a ler

Roseana e Ziraldo

Estes últimos dias foram de muita emoção para mim. Primeiro tive o choque da notícia do ataque que sofreu a grande poeta Roseana Murray — felizmente seguida pela informação de que ela está fora de perigo e atravessou a emergência. Depois veio a morte do Ziraldo, velho amigo, extraordinário artista. Não sei se souberam o que aconteceu com a Roseana Murray. Nós nos tornamos muito amigos por intermédio de meu querido Juan Arias, grande jornalista e escritor espanhol, a quem devo minha primeira apresentação aos leitores espanhóis. Correspondente de El País no Continue a ler

Roseana e Ziraldo

Estes últimos dias foram de muita emoção para mim. Primeiro tive o choque da notícia do ataque que sofreu a grande poeta Roseana Murray — felizmente seguida pela informação de que ela está fora de perigo e atravessou a emergência. Depois veio a morte do Ziraldo, velho amigo, extraordinário artista. Não sei se souberam o que aconteceu com a Roseana Murray. Nós nos tornamos muito amigos por intermédio de meu querido Juan Arias, grande jornalista e escritor espanhol, a quem devo minha primeira apresentação aos leitores espanhóis. Correspondente de El País no Continue a ler

Não está aqui

Comemoramos mais uma Páscoa, momento central do cristianismo, porque a Ressurreição, já dizia São Paulo, é o elemento que justifica a nossa fé: “Sem a Ressurreição, é vã a nossa fé!” Madrugada ainda, nascido o Sol: assim registra Marcos o momento em que as Marias procuraram Jesus para completar os ritos do sepultamento que não haviam tido tempo de fazer na tarde da sexta-feira terrível. O Padre Vieira explicava que não havia contradição entre os dois termos, pois se era madrugada e ainda não era dia, já nascera o Sol, Continue a ler

Não está aqui

Comemoramos mais uma Páscoa, momento central do cristianismo, porque a Ressurreição, já dizia São Paulo, é o elemento que justifica a nossa fé: “Sem a Ressurreição, é vã a nossa fé!” Madrugada ainda, nascido o Sol: assim registra Marcos o momento em que as Marias procuraram Jesus para completar os ritos do sepultamento que não haviam tido tempo de fazer na tarde da sexta-feira terrível. O Padre Vieira explicava que não havia contradição entre os dois termos, pois se era madrugada e ainda não era dia, já nascera o Sol, Continue a ler

Odylo e o Jornal do Brasil

Quando iniciava minha vida política, sentando-me como suplente nas cadeiras do Palácio Tiradentes, tive a oportunidade de acompanhar de muito perto a maior transformação por que passou a imprensa brasileira: a que Odylo Costa, filho fez no Jornal do Brasil. Agora Luiz Gutemberg publica JB: A invenção do maior jornal do Brasil, em que conta a reforma com os olhos de quem era então um jovem repórter. Conheci bem as circunstâncias que levaram Odylo ao JB. O jornal era propriedade do Conde Ernesto Pereira Carneiro, empresário pernambucano que o tinha como principal ativo. Continue a ler

Odylo e o Jornal do Brasil

Quando iniciava minha vida política, sentando-me como suplente nas cadeiras do Palácio Tiradentes, tive a oportunidade de acompanhar de muito perto a maior transformação por que passou a imprensa brasileira: a que Odylo Costa, filho fez no Jornal do Brasil. Agora Luiz Gutemberg publica JB: A invenção do maior jornal do Brasil, em que conta a reforma com os olhos de quem era então um jovem repórter. Conheci bem as circunstâncias que levaram Odylo ao JB. O jornal era propriedade do Conde Ernesto Pereira Carneiro, empresário pernambucano que o tinha como principal ativo. Continue a ler

A Democracia e as leis da guerra

Nos conceitos de progresso do ser humano que eram correntes quando iniciei minha vida, um dos que pareciam mais sólidos era o de que o homem deixara de ser um animal naturalmente violento para, adquirindo inteligência, organizar-se em paz. A ideia do progresso biológico foi desmentida pela simples aplicação da teoria da evolução, e a sociedade pacífica nunca prevaleceu. Continuávamos, no entanto, pensando que a Humanidade progredia em relação ao sistema de governo, encaminhando-se inexoravelmente para a democracia. Se não é verdade, pelo menos acreditamos que ela é a única Continue a ler

A Democracia e as leis da guerra

Nos conceitos de progresso do ser humano que eram correntes quando iniciei minha vida, um dos que pareciam mais sólidos era o de que o homem deixara de ser um animal naturalmente violento para, adquirindo inteligência, organizar-se em paz. A ideia do progresso biológico foi desmentida pela simples aplicação da teoria da evolução, e a sociedade pacífica nunca prevaleceu. Continuávamos, no entanto, pensando que a Humanidade progredia em relação ao sistema de governo, encaminhando-se inexoravelmente para a democracia. Se não é verdade, pelo menos acreditamos que ela é a única Continue a ler

De pernas para o ar

Quando eu nasci, em 1930, o Mundo já se encontrava num período de mudanças aceleradas. Acompanhei as maiores transformações do século 20, e Deus me deu a oportunidade de ver as deste começo de novo século. A maior delas foi a da comunicação. É claro que ela sofrera o primeiro choque no Egito, como conta o famoso diálogo entre Sócrates e Fedro, em que o Deus Thoth traz ao rei a escrita e escuta a terrível interrogação: “Mas o que será da memória”? Demorou muito tempo até chegarmos ao que Continue a ler

De pernas para o ar

Quando eu nasci, em 1930, o Mundo já se encontrava num período de mudanças aceleradas. Acompanhei as maiores transformações do século 20, e Deus me deu a oportunidade de ver as deste começo de novo século. A maior delas foi a da comunicação. É claro que ela sofrera o primeiro choque no Egito, como conta o famoso diálogo entre Sócrates e Fedro, em que o Deus Thoth traz ao rei a escrita e escuta a terrível interrogação: “Mas o que será da memória”? Demorou muito tempo até chegarmos ao que Continue a ler

Anarcopopulismo

Quando se formavam as bases da democracia moderna, no período entre as revoluções inglesa, americana e francesa, ou entre Locke, Voltaire, Rousseau, Madison — isto é, quando se invocava o predomínio da razão —, surgiu uma palavra para negar valores: niilismo. Etimologicamente, a palavra vinha de “nada”, podia-se dizer que era a negação das ideias. Nietzsche lhe deu sua carta de alforria. O niilismo, segundo ele, esvaziava a humanidade de significado, propósito, valores. Mas a frase definitiva é de Dostoiévski: “Se Deus não existe, tudo é permitido.” Ser um niilista Continue a ler

Anarcopopulismo

Quando se formavam as bases da democracia moderna, no período entre as revoluções inglesa, americana e francesa, ou entre Locke, Voltaire, Rousseau, Madison — isto é, quando se invocava o predomínio da razão —, surgiu uma palavra para negar valores: niilismo. Etimologicamente, a palavra vinha de “nada”, podia-se dizer que era a negação das ideias. Nietzsche lhe deu sua carta de alforria. O niilismo, segundo ele, esvaziava a humanidade de significado, propósito, valores. Mas a frase definitiva é de Dostoiévski: “Se Deus não existe, tudo é permitido.” Ser um niilista Continue a ler

A união do Mundo

O Presidente Lula tem feito, com a ajuda de dois grandes e experientes diplomatas, Celso Amorim e Mauro Vieira, um trabalho importantíssimo, para o Brasil e para a Humanidade: impulsionar a reforma das Nações Unidas. Falei do assunto há umas semanas e retorno a ele, pois eu também, quando era Presidente da República, trabalhei nesse sentido e, assim, nele tenho uma parcela de responsabilidade. É preciso dizer que, se temos críticas ao funcionamento da ONU, é justamente por reconhecer o seu papel fundamental em todos os campos da ação internacional. Continue a ler

Na Quadragésima

Passamos o Domingo da Quadragésima, o Primeiro Domingo da Quaresma. Quadragésima e Quaresma vêm dos quarenta dias que se repetem na liturgia católica e na Bíblia: é o período da purificação, como o que Jesus Cristo passou no deserto, ou como o que Nossa Senhora levou antes de apresentar, com São José, Jesus no Templo; mas é também o período que o Ressuscitado leva antes de subir ao Céu e o que a Arca fica suspensa nas águas e o que Moisés fica no Sinai esperando a Lei etc. No Continue a ler

Na Quadragésima

Passamos o Domingo da Quadragésima, o Primeiro Domingo da Quaresma. Quadragésima e Quaresma vêm dos quarenta dias que se repetem na liturgia católica e na Bíblia: é o período da purificação, como o que Jesus Cristo passou no deserto, ou como o que Nossa Senhora levou antes de apresentar, com São José, Jesus no Templo; mas é também o período que o Ressuscitado leva antes de subir ao Céu e o que a Arca fica suspensa nas águas e o que Moisés fica no Sinai esperando a Lei etc. No Continue a ler

Tempo de Debochar

O que fazer? Carnaval é tempo de debochar. Esse verbo veio do francês débaucher, que tem um significado mais restrito, mas não escapa à largueza do deboche brasileiro. O sentido original está muito ligado aos abusos da carne, de cama e de mesa, aos pecados da luxúria e da gula. Coisa antiga, com deuses e costumes: o filho da Noite, Momo, acompanhado do filho da Húbris, Como, representam a zombaria e a festa. Estão, portanto, muito ligados a Baco-Dionísio e às bacanais, que já foram bacanas, em tempos em que essa Continue a ler

Tempo de Debochar

O que fazer? Carnaval é tempo de debochar. Esse verbo veio do francês débaucher, que tem um significado mais restrito, mas não escapa à largueza do deboche brasileiro. O sentido original está muito ligado aos abusos da carne, de cama e de mesa, aos pecados da luxúria e da gula. Coisa antiga, com deuses e costumes: o filho da Noite, Momo, acompanhado do filho da Húbris, Como, representam a zombaria e a festa. Estão, portanto, muito ligados a Baco-Dionísio e às bacanais, que já foram bacanas, em tempos em que essa Continue a ler

A longa visita do Aedes brasilicus

Há muitos anos contei como o aegypti abrasileirou-se. Naqueles tempos pré-pandêmicos lembrei uma reunião do InterAction Council que relacionara as doenças desconhecidas como ameaça ao futuro da humanidade. Uma delas, vestida de Covid-19, veio e ficou. Mas mais longa é a visita do Aedes brasilicus. O bichinho é danado. Africano, tornou-se brasileiro cedo. Trouxe nossas primeiras epidemias, de febre amarela de 1685, no Recife, e de 1686, em Salvador, com alguns milhares de mortos. No século XX, Rodrigues Alves convocou Osvaldo Cruz para fazer uma revolução sanitária no Rio de Janeiro. A cidade Continue a ler

A longa visita do Aedes brasilicus

Há muitos anos contei como o aegypti abrasileirou-se. Naqueles tempos pré-pandêmicos lembrei uma reunião do InterAction Council que relacionara as doenças desconhecidas como ameaça ao futuro da humanidade. Uma delas, vestida de Covid-19, veio e ficou. Mas mais longa é a visita do Aedes brasilicus. O bichinho é danado. Africano, tornou-se brasileiro cedo. Trouxe nossas primeiras epidemias, de febre amarela de 1685, no Recife, e de 1686, em Salvador, com alguns milhares de mortos. No século XX, Rodrigues Alves convocou Osvaldo Cruz para fazer uma revolução sanitária no Rio de Janeiro. A cidade Continue a ler

Fofoca e realeza

A imprensa inglesa pratica um esporte em que é campeã mundial e invicta: a fofoca aristocrática, o gossip. É claro que o governo inglês faz um grande esforço para promovê-lo, não sei se tanto quanto dedica à difusão do futebol pelos hooligans, que instituíram o quebra-quebra como o melhor trunfo do nobre esporte bretão. Quanto mais republicana a democracia dos países, maior o interesse na aristocracia. Os veículos são os tabloides, formato dominante entre os scandal sheet ou yellow journalism (o que chamamos de imprensa marrom) ou rags. Difundidos no mundo inteiro, eles assumiram agora a ponta Continue a ler

Fofoca e realeza

A imprensa inglesa pratica um esporte em que é campeã mundial e invicta: a fofoca aristocrática, o gossip. É claro que o governo inglês faz um grande esforço para promovê-lo, não sei se tanto quanto dedica à difusão do futebol pelos hooligans, que instituíram o quebra-quebra como o melhor trunfo do nobre esporte bretão. Quanto mais republicana a democracia dos países, maior o interesse na aristocracia. Os veículos são os tabloides, formato dominante entre os scandal sheet ou yellow journalism (o que chamamos de imprensa marrom) ou rags. Difundidos no mundo inteiro, eles assumiram agora a ponta Continue a ler

Ainda o sonho de Paz

É muito velho o sonho da Paz. Muitos idealistas, santos e possuídos da ira santa da concórdia entre os homens foram militantes dessa causa. Não é demais recordar que Kant, cujos livros são de leitura especializada para iniciados e filósofos, escreveu um livro que tentou ser um livro “popular”, de linguagem acessível a todos, um panfleto — A paz perpétua —, no qual ele oferecia uma fórmula para chegarmos a esse paraíso. Nem a fórmula funcionou nem o livro foi popular. Ficou mesmo restrito aos iluminados. A história contemporânea — lembrei a Continue a ler

Ainda o sonho de Paz  

É muito velho o sonho da Paz. Muitos idealistas, santos e possuídos da ira santa da concórdia entre os homens foram militantes dessa causa. Não é demais recordar que Kant, cujos livros são de leitura especializada para iniciados e filósofos, escreveu um livro que tentou ser um livro “popular”, de linguagem acessível a todos, um panfleto — A paz perpétua —, no qual ele oferecia uma fórmula para chegarmos a esse paraíso. Nem a fórmula funcionou, nem o livro foi popular. Ficou mesmo restrito aos iluminados.  A história contemporânea — lembrei a Continue a ler

As Nações Unidas para a Paz

A experiência terrível da Segunda Guerra Mundial mostrou que a Sociedade das Nações fracassou. Criada em Versalhes para administrar a Paz, tinha grandes e graves limitações, a começar pela falta de apoio dos Estados Unidos, que a haviam proposto. Os famosos Quatorze Pontos de Woodrow Wilson eram exemplares: I – os acordos de Paz sem cláusulas secretas; II – a liberdade de navegação; III – a liberdade de comércio; IV – o fim do armamentismo; V – o ajuste das disputas coloniais; de VI a XIII, a retirada das tropas Continue a ler