A marchinha de Francisco Mattoso lança o grito que nos últimos dias está na pele de todos: “Meu coração amanheceu / Pegando fogo, fogo, fogo!” Coração e braços e pernas estão assando com o caloraço de setembro. Nada da morena que passou perto: foram os recordes de temperatura que nos deixaram assim. Nós aqui no Maranhão até que escapamos das temperaturas quarentenárias e não precisamos entrar em quarentena, mas no Sul Maravilha a coisa foi feia. Felizmente nós somos um povo que é antes de tudo um forte e não Continue a ler
Ester de Assis Oliveira, 9 anos; Maria Eduarda Martins, 9 anos; Lohan Samuel, 11 anos; Djalma de Azevedo Clemente, 11 anos; Eloah Passos, 5 anos; Rafaelly da Rocha Vieira, 10 anos; Juan Davi de Souza Faria, 11 anos; Heloísa dos Santos Silva, 3 anos: cada uma dessas crianças foi morta à bala no Rio de Janeiro!!!! São nomes que clamam aos céus contra o estado de barbárie em que vivemos, registros da saudade que não passa sentida por suas famílias. Antigamente quando uma criança morria era — o sentido ainda está Continue a ler
Documentos, livros, obras de arte, registros audiovisuais, objetos raros. Esses são alguns itens que fazem parte do acervo doado por José Sarney à Fundação da Memória Republicana, instalada no Convento das Mercês, localizado no bairro Desterro em São Luís. Os bens correspondem ao período em que ele exerceu a Presidência da República, de 1985 a 1990 e, também, peças e documentos que juntara ao longo da vida, até mesmo antes da Presidência. Esse é o único acervo presidencial que se encontra abrigado na região Nordeste do país. Localizada no prédio Continue a ler
O contexto da política nacional sob o olhar de quem participou de um momento histórico do Brasil: José Sarney, o presidente que conduziu a retomada do país para a Democracia, após 20 anos do Governo Militar. Essa é a tônica de O Brasil no seu labirinto, próxima obra de autoria de José Sarney que será lançada no primeiro semestre de 2024. A produção não é um romance, sim uma análise minuciosa sobre os caminhos e movimentações da política recente do país, a partir do olhar atento de Sarney. “O livro Continue a ler
Perdi a conta do número de vezes em que falei da cidade que formou a minha vida: esta velha e jovem São Luís, que fez aniversário na sexta-feira passada. Minha paixão por São Luís começou quando aqui desembarquei vindo de São Bento no barco de mestre Braulino, o “Filha de São Bento”. Eu tinha doze anos. De longe, ao anoitecer, vi as luzes da cidade. Era clara e bela. Desembarquei na impressão da multiplicidade das coisas: carroças, malas, sacos, cofos, gentes. E do bonde elétrico. Nunca tinha visto um sobrado, Continue a ler
De passagem por São Luís, o aclamado escritor Laurentino Gomes fez uma visita de cortesia ao ex-presidente e escritor José Sarney. No encontro regado a temas literários, Gomes lembrou que citou um episódio envolvendo José Sarney no seu livro 1822, ao contar a história de Lorde Cochrane. Gomes teria ficado sabendo por meio de Elio Gaspari que José Sarney, em visita oficial à Abadia de Westminster, em Londres, teria disfarçadamente pisado em sua lápide, a quem o chamou de “corsário”. Esse causo foi mencionado no livro e, anos mais tarde, confirmado por Continue a ler
Quando cheguei ao Rio, há muitos e muitos anos, brilhava um escritor um pouco mais velho que eu, Sérgio Porto, extraordinário cronista, seja como ele mesmo, seja como seu heterônimo Stanislaw Ponte Preta. O Stanislaw tinha uma coluna em que debochava dos costumes, bons e maus, numa fonte incessante de risos e gargalhadas. Infelizmente o Sérgio morreu muito moço, aos 45 anos. Quando começou a temporada militar, o Stanislaw criou uma seção na coluna com o nome de Febeapá: era o “festival de besteiras que assola o país”. Lá colecionava Continue a ler
Faleceu há poucos dias uma grande escritora, Hélène Carrère d’Encausse, Secretário-Perpétuo da Academia Francesa (utilizo o título de sua função no masculino porque era assim que ela queria) desde a renúncia de Maurice Druon, em 1999. De origem georgiana — nascida em Paris, foi apátrida por muitos anos —, era especialista em Rússia e no universo eslavo. Foi uma amiga que recebeu a Academia Brasileira de Letras naquela Casa com a grande elegância que a caracterizava. Madame Encausse era conservadora e simpatizava com Vladimir Putin. O começo da guerra da Continue a ler
Tenho a fama de ser supersticioso, e sou, mas não sei se mais do que a maioria das pessoas. Não tenho simpatia pelo mês de agosto. Agosto rima com desgosto. O nome vem do jovem Caio Otávio, já Gaius Julius Caesar Octavianus ao ser adotado pelo tio, depois Imperator Caesar, ao derrotar os assassinos, e Imperador César Augusto, ao aceitar modestamente a condição de fundador do Império e de filho do deus Julius. Dado ao oitavo mês do calendário romano, Sextilis, que já fora o sexto, acabou sendo um mês Continue a ler
Falei, há poucos dias, do Estatuto do Desarmamento, que está completando 20 anos, e de sua importância para a redução da violência. Lembrei que a proibição de comercialização de armas de fogo e munições tinha sido, infelizmente, derrubada por um plebiscito — instrumento legislativo de desastrosa aplicação em nosso País. O Estatuto do Desarmamento começa agora a ser reativado depois de um período catastrófico, que permitiu um aumento vertiginoso das armas em mãos de civis. Armas são um desastre do ponto de vista da defesa pessoal, ao contrário do argumento Continue a ler
Os estudantes do Centro Educa Mais Professora Margarida Pires Leal foram surpreendidos com a presença do ex-presidente José Sarney durante uma palestra, na tarde desta quarta-feira (9), na Academia Maranhense de Letras (AML). José Sarney chagou mais cedo antes da palestra de Antônio Carlos Secchin em homenagem a Gonçalves Dias, e teve um bate papo sobre literatura e relembrou sua carreira como escritor. O ex-presidente disse sentir satisfação da falar sobre literatura para um grupo de jovens. Sarney relembrou que entrou na Academia de Letras aos 22 anos de idade, Continue a ler
Esta semana, dia 10, afinal — já faço o anúncio há tempos — acontece o bicentenário de nascimento do nosso maranhense mais ilustre, o moço que reuniu os sangues negro, indígena e branco e criou a poesia brasileira. Alguém dirá um e outro nome de poeta — e Gregório de Matos? e Tomás António Gonzaga? e Cláudio Manuel da Costa? e José Bonifácio? e Gonçalves de Magalhães? e …? Poetas, sem dúvida, foram, e mesmo grande poeta, como no caso do Boca do Inferno, mas, brasileiros ou portugueses, não fizeram Continue a ler
O século XX viu a implantação em todo o Ocidente do Welfare State, o Estado de Bem-Estar Social ou Estado Social de Direito. Suas raízes podem ser detectadas na Antiguidade, como exemplo as ações dos irmãos Gracos e dos populares em Roma, fazendo a reforma agrária e sistematizando a distribuição de trigo para o proletariado. Distorcido pelos Estados concentracionários entre as duas guerras mundiais, depois de 1945 generalizou-se por toda a Europa como um fator decisivo de desenvolvimento. No Brasil seguimos esse passo com grandes limitações. Já nos anos 30 criamos os Continue a ler
Há exatos vinte anos, no dia 23 de julho de 2003, foi aprovado no Senado Federal o Estatuto do Desarmamento. Como havíamos acordado, eu, então Presidente do Senado, e o Deputado João Paulo Cunha, Presidente da Câmara dos Deputados, o projeto era o resultado do trabalho de uma comissão conjunta das duas Casas, o que significou uma rápida aprovação na Revisora. Em dezembro coube-me encaminhar o projeto para a sanção presidencial, que ocorreu no dia 23 de dezembro de 2003. Infelizmente o projeto teve um dos seus pontos centrais, a Continue a ler
Escrevi sobre o maior poeta lírico da língua portuguesa —digo sem esquecer que é a língua de Luís de Camões. Falei do seu romance com Ana Amélia, mas devo ao leitor mais algumas palavras. Esta paixão não só resultou nos incomparáveis versos do reencontro, como foi e é uma expressão dos profundos conflitos éticos nas relações raciais no Brasil — sobre a escravidão os conflitos eram políticos, pois os escravocratas tinham convicção absoluta de sua superioridade branca; os abolicionistas, a certeza da igualdade dos humanos: “são iguais, mas há limites”. Continue a ler
Abril, chuvas mil. Maio, trovões e raio. Este é um ditado que se repete para definir o tempo das chuvas no Maranhão. O Padre Vieira foi quem primeiro definiu inverno/verão, o tempo das chuvas e o que não chove. Assim as estações, que no mundo são quatro, no Maranhão são duas. O diabo é que elas não coincidem nem com primavera, nem com verão, nem com outono, nem com inverno. No Maranhão se chama de inverno o tempo que chove, que vai de dezembro a junho, e de verão, o Continue a ler
Éramos jovens. Nos conhecemos no Rio de Janeiro, na Rua Otaviano Hudson, onde José Aparecido mantinha uma pensão estudantil, udenista, com ramificações pela esquerda. Pertence era mais ligado a seu irmão Modesto, da UNE, onde tinha posições de liderança. Eu começava minha carreira como deputado federal, ligado a Magalhães Pinto, de quem Aparecido era secretário particular. Era um tempo em que eu chamava Pertence de “Zé Paulo”, e ele a mim de “Zé”; quando nos encontrávamos e não tinha abelhudo por perto, eu repetia os tratamentos da mocidade: “Ministro Zé Continue a ler
Eu tinha 15 anos quando ocorreram os dois “elementos de dissuasão” que rasgaram a História da Humanidade: as bombas de Hiroshima e Nagasaki. Seu lançamento quase simultâneo — uma foi lançada a 6 e a outra a 9 de agosto de 1945 — mostra que havia mais que o pretexto do General George Marshall: “facilmente acessível e que pode com certeza diminuir o número de vítimas americanas”. Segundo estes cálculos “misericordiosos”, uma invasão do Japão implicaria na morte de 400 a 800 mil americanos e cinco a dez milhões de Continue a ler
Ontem o Papa Francisco divulgou a carta apostólica Grandeza e Miséria do Homem, louvando aquele que fez os mais violentos ataques contra a Companhia de Jesus, a que ele pertence: Blaise Pascal. O motivo é a comemoração dos quatrocentos anos de nascimento desse gênio precoce que marcou profundamente a cultura francesa — a cultura universal. Sua história parece ficção. Filho de um funcionário público, órfão da mãe aos três anos, foi um menino doente, que estudou em casa. O pai, temeroso com a curiosidade do filho sobre a natureza das coisas, Continue a ler
Há muita polêmica sobre responsabilidades pela guerra na Ucrânia, que se faz ser um caso de luta entre o bem e o mal. Essa visão é comum em qualquer guerra, e estas são aceitas como uma prática normal, uma maneira de resolver os conflitos. Como a maioria das nações, o Brasil já enfrentou a guerra externa e a guerra intestina. Pagou por isso um preço enorme, mas incontável mesmo é o que pagaram os mortos e suas famílias. Esse preço em vidas humanas desaparece como estatísticas, mas as pessoas são Continue a ler
A grande jornalista Dorrit Harazin, que certamente tem um dos mais límpidos e melhores estilo da crônica brasileira, levanta esta semana um tema fundamental, o da liberdade do livro. Ela examinou neste último fim de semana o contraste entre como o governador do Illinois, J. B. Priktzer, e o da Flórida, Ron DeSantis, tratam o livro — um como instrumento da promoção cultural, outro como instrumento do preconceito e do facciosismo político. A ideia da censura está ligada à do domínio. Ela foi praticada desde a antiguidade. O próprio nome Continue a ler
Dizem que a imprensa vive de crises e dramas; o lado positivo dos acontecimentos raramente tem a mesma cobertura. Há, sem dúvida, alguma verdade nisso. Mas há também a exceção da verdade, para prevenirmos desde já o que poderia ser uma calúnia. Eu, por exemplo, já escrevi algumas dezenas de textos em que o título contém a palavra “crise”. É que o Brasil tem a crise enraizada na sua estrutura política. A Independência nasceu da crise do Reino Unido, que foi desunido pela vontade portuguesa de que voltássemos a ser Continue a ler
Temos uma tendência a pensar que os anos são bons ou maus, mas, parafraseando Ortega y Gasset, podemos dizer que os anos são os anos e suas circunstâncias. Falei nas últimas semanas de dois bicentenários de nascimento, o do Parlamento brasileiro e o de Gonçalves Dias. Ali mesmo na velha cidade de Caxias, no Alto Itapicuru, onde nasceu a 10 de agosto o filho de Dona Vicência que seria o maior poeta brasileiro, havia poucos dias — no dia 31 de julho — tinham se rendido as tropas portuguesas comandadas Continue a ler
Aproxima-se o bicentenário de nascimento de Gonçalves Dias. Haverá festa, aqui e ali, mas não vejo programada a grande homenagem que o Brasil deve a seu primeiro grande poeta. Ele morreu muito moço, afogado, quando chegava de volta ao Maranhão. Voltava para morrer de vários males, o principal a tuberculose, e estava já agonizante. Na véspera, avistada a linha da costa, pedira que o levassem ao convés para ver seu Brasil, seu Maranhão — e desmaiou de emoção! Mestiço, filho natural, baixinho — “pequeno, baixo, ligeiro”, disse Machado de Assis Continue a ler
Quem examina o bicentenário do Parlamento encontra uma figura onipresente, maior que os acontecimentos, a quem não se dá o valor devido e que, embora seja frequentemente mencionado, não é ouvido. Falo de José Bonifácio de Andrada e Silva. A obra de José Bonifácio, muito fragmentada, talvez seja em parte responsável por isso. Cientista, grande parte de seus papéis tratam de ciências e aplicação de ciências; outro tanto são documentos oficiais, marcados pelos limites do fato — sua outra face era ser essencialmente um homem de ação. Mas uma parcela Continue a ler
O dia 3 de maio de 1823 foi, segundo dois dos protagonistas do dia — o que discursava, Pedro do Brasil, imperador por ter feito a independência, e o principal redator do discurso, José Bonifácio de Andrada e Silva — “… o dia maior que o Brasil tem tido, dia em que ele pela primeira vez começa a mostrar ao mundo que é Império livre”. Essa afirmação era uma reafirmação. Já desde o dia 11 de janeiro do ano anterior as leis portuguesas precisavam do reconhecimento do Príncipe Regente. Já Continue a ler
No dia 17 de abril de 1823 realizou-se a primeira sessão preparatória da Assembleia Geral Constituinte e Legislativa do Império do Brasil. Começava a funcionar a democracia brasileira. A mesa interina tinha como presidente o Bispo capelão-mór, D. José Caetano da Silva Coutinho, e como secretário Manuel José de Sousa França, ambos da bancada da Capital. O prelado era de formação pombalina, mas pendia para os liberais. O Brasil vivia o confronto entre os que José Honório Rodrigues chamou de “construtores” — com cérebro e comando de José Bonifácio de Continue a ler
A Constituição consagrou um princípio relativamente novo: o da ação afirmativa. De uma forma aparentemente contraditória, ele aparece inicialmente no art. 3º, ao colocar entre os objetivos fundamentais da República o “bem de todos”, sem “quaisquer formas de discriminação”. Ora, a leitura deste inciso deve ser vista com a ótica do enunciado de Rui Barbosa de que a igualdade consiste em tratar desigualmente os desiguais. No art. 4º nossa Carta repudia o racismo; no 5º, veda e pune a discriminação e o racismo (XLI e XLII), com “aplicação imediata”. Mais Continue a ler
O paroxismo da violência, mesmo diante da sombria perspectiva histórica, nos atinge como um raio, gerando uma carga de emoções difíceis de suportar. Tivemos duas dores estreitamente ligadas, na semana que passou. A primeira é de agora, será absorvida pela sociedade, mas não pelas famílias das vítimas, logo que se apague o clarão de seu relâmpago. É a brutalidade desmedida e monstruosa contra os pequeninos de Blumenau. A segunda é eterna, é a imolação de Jesus Cristo, penetrado da condição humana até ao abandono pelo Pai. Há sessenta anos eu Continue a ler
Como intelectual sempre tive uma preocupação humanista nas minhas decisões, preocupando-me não apenas em melhorar a sorte do povo brasileiro como também a de toda a Humanidade. Assim, três coisas me enchem de orgulho. A primeira, ter acabado com a corrida nuclear na América do Sul, onde Brasil e Argentina tinham uma disputa histórica. Assim, juntamente com Raul Alfonsín, então Presidente da Argentina, encerramos essa disputa: ele me levou para visitar a Usina de Pilcaniyeu, na Argentina, e eu o trouxe para visitar a Usina de Aramar, selando a confiança Continue a ler