O ex-presidente José Sarney recebeu na noite desta quarta-feira (18) o título de Doutor Honoris Causa, em reconhecimento às suas contribuições ao Estado Democrático de Direito do Brasil. A homenagem foi concedida pelo Instituto Brasileiro de Ensino, Desenvolvimento e Pesquisa (IDP) e foi realizada durante o 26º Congresso Internacional de Direito Constitucional, organizado pela instituição, em Brasília. O evento, que é realizado até amanhã (19), conta na programação com a presença de autoridades como o presidente do Supremo Tribunal Federal (STF), Luís Roberto Barroso, e os ministros Gilmar Mendes, Cármen Continue a ler
Documentos, livros, obras de arte, registros audiovisuais, objetos raros. Esses são alguns itens que fazem parte do acervo doado por José Sarney à Fundação da Memória Republicana, instalada no Convento das Mercês, localizado no bairro Desterro em São Luís. Os bens correspondem ao período em que ele exerceu a Presidência da República, de 1985 a 1990 e, também, peças e documentos que juntara ao longo da vida, até mesmo antes da Presidência. Esse é o único acervo presidencial que se encontra abrigado na região Nordeste do país. Localizada no prédio Continue a ler
O dia 3 de maio de 1823 foi, segundo dois dos protagonistas do dia — o que discursava, Pedro do Brasil, imperador por ter feito a independência, e o principal redator do discurso, José Bonifácio de Andrada e Silva — “… o dia maior que o Brasil tem tido, dia em que ele pela primeira vez começa a mostrar ao mundo que é Império livre”. Essa afirmação era uma reafirmação. Já desde o dia 11 de janeiro do ano anterior as leis portuguesas precisavam do reconhecimento do Príncipe Regente. Já Continue a ler
No dia 17 de abril de 1823 realizou-se a primeira sessão preparatória da Assembleia Geral Constituinte e Legislativa do Império do Brasil. Começava a funcionar a democracia brasileira. A mesa interina tinha como presidente o Bispo capelão-mór, D. José Caetano da Silva Coutinho, e como secretário Manuel José de Sousa França, ambos da bancada da Capital. O prelado era de formação pombalina, mas pendia para os liberais. O Brasil vivia o confronto entre os que José Honório Rodrigues chamou de “construtores” — com cérebro e comando de José Bonifácio de Continue a ler
Antônio Paulino Limpo de Abreu, Visconde de Abaeté, foi senador por 36 anos. Quando eleito, em 1847, fora juiz, ouvidor, desembargador, Ministro do Supremo Tribunal de Justiça, deputado, Presidente da Câmara dos Deputados, Presidente da Província de Minas Gerais, membro do Conselho de Estado, oito vezes ministro — depois foi mais cinco vezes ministro, além de Presidente do Conselho de Ministros. Depois presidiu o Senado do Império por doze anos. O velho Senado era diferente, conta Machado de Assis: “Nenhum tumulto nas sessões. A atenção era grande e constante. […] Continue a ler
Durante a maior parte de minha vida o começo do mês de fevereiro significava a abertura da Sessão Legislativa. Como acredito na “liturgia” das instituições, pois a ação concreta depende das vontades e estas do caráter simbólico dos gestos e das palavras, sempre a essas solenidades dei grande importância. Chega-se a elas com as expectativas do que será construído nos próximos meses, com a reflexão sobre como se pode contribuir para alcançar o objetivo da política, que é o estabelecimento da justiça social. Algumas vezes me coube o papel de Continue a ler
A última sucessão presidencial americana mostrou fatos que ninguém jamais imaginou pudessem acontecer nos Estados Unidos: negação da lisura das eleições, invasão do congresso para evitar a diplomação do eleito e a troca de afirmações contrárias ao sistema democrático constituíram uma surpresa a nós que pensávamos que a democracia americana era sólida. A chave da construção dos founding fathers é de que o embate das forças, quando é grande o tamanho da amostra, gera o equilíbrio. Foi o que descreveu Tocqueville, no seu tratado clássico sobre a democracia nos Estados Continue a ler
A democracia tem dois corações: o sistema representativo e a liberdade de imprensa. Afonso Arinos, certa vez, quando conversávamos sobre a Constituição americana e a formação do Senado, lembrou que a questão se colocara desde a abertura dos debates da Convenção de Filadélfia, no dia 29 de maio de 1787, inserida pelo Projeto de Virgínia. Todos concordaram com a ideia de duas casas, à maneira inglesa. A grande dúvida era como conciliar o poder dos grandes e dos pequenos Estados. Na sua primeira Constituição cada Estado tinha poder igual, uma Continue a ler
Os problemas do Brasil atravessam o tempo sem solução. Para ilustrar os riscos dessa imobilidade, repito aqui, com os elementos da época — final de outubro de 2014 —, um dos muitos artigos em que tratei do tema da divisão do País: “A eleição contabilizou uma hipoteca séria que vai marcar o futuro governo: um país dividido. Carlos Drummond de Andrade escreveu que vivíamos um ‘tempo de partido, / tempo de homens partidos’. Estamos divididos, na pequena diferença do resultado entre os candidatos, entre pobres e ricos, Nordeste e Sudeste, Continue a ler
Quando, em janeiro de 1985, Tancredo Neves e eu fomos eleitos por um grande acordo da sociedade, tínhamos muito claro um compromisso: a transição para a democracia. A partir da eleição é que, no espaço cedido pela Fundação Getúlio Vargas, começou-se a detalhar números e tarefas. Antes de janeiro a tarefa não apenas era impossível por não dispormos dos dados reais sobre o funcionamento do governo, mas sobretudo porque a dimensão do que se decidiria na eleição era política e institucional, num nível superior de decisão: estava em jogo o Continue a ler
Alexis de Tocqueville, em sua clássica e famosa obra, “A Democracia Americana”, que já caminha para dois séculos de sua primeira edição (1835), fez a apologia do regime praticado nos Estados Unidos, único no mundo com suas características, até então, e disse de suas grandes e inovadoras virtudes. Tão boas que essas instituições se espalharam no mundo inteiro, inclusive no Brasil, onde a República, sob a inspiração de Rui Barbosa, moldou a Constituição de 1891 com o domínio das ideias civilistas dos direitos individuais e do poder político, síntese de Continue a ler
Volto ao tema da última semana. Os partidos no Brasil datam da primeira metade do século XIX. Os dois partidos do Império, Liberal e Conservador, de luzias e saquaremas, funcionaram sob o punho autocrático do Poder Moderador. Todas as vantagens do parlamentarismo ficavam nubladas por D. Pedro II quando dissolvia os ministérios não pela vontade da maioria, mas por seu próprio juízo. Foi a advertência que lhe fez Nabuco, que ninguém pode acusar de hostil ao regime. Na República Velha os partidos eram estaduais e tinham dono — e esses Continue a ler
Quero agradecer ao Presidente Merval Pereira — que com tanta eficiência vemos dirigir esta Casa — o convite que me fez para ser o orador desta sessão tão significativa para todos nós e para o Brasil, porque mostra a perenidade desta Instituição que há 125 anos é a guardiã da língua e dos nossos valores espirituais, construída pelo gigantesco patrimônio cultural das obras dos que por aqui passaram e dos que aqui estão. Quando tomei posse nesta Casa em 1980, sucedendo ao grande escritor e político José Américo de Almeida, Continue a ler
Quando as Nações Unidas ainda começavam o sonho de conciliação universal — frustrado até hoje, mas ainda vivo para quem acredita no primado do Direito —, foi escrita, com grande participação de Austregésilo de Athayde, a Declaração Universal dos Direitos Humanos. Ela declara: “Todo indivíduo tem direito à vida, à liberdade e à segurança pessoal.” No horrível episódio deste fim de semana, em Foz do Iguaçu, o militante petista Marcelo Arruda foi assassinado por um militante bolsonarista. A exacerbação da violência culminou, como era previsível, com a morte de um Continue a ler
O Brasil levou muito tempo para alcançar um dos pontos essenciais da democracia, que é o voto. Durante o Império, o voto foi sempre objeto de ansiedade e preocupação. O primeiro ponto era a questão de quem a ele tinha direito. Desde a eleição para a Assembleia Constituinte o voto foi censitário, isto é, restrito a quem preenchia certas condições econômicas. A Constituição de 1824 manteve o critério: eram eleitores todos os cidadãos, excluídos os menores de 25 anos, os filhos família, os criados de servir, os religiosos e os Continue a ler
Diante das revelações que saem agora nos Estados Unidos, de que Trump queria acabar com a Constituição americana, com mais de duzentos anos de existência, e dar um golpe de Estado, vemos que a velha realidade do sonho de Monroe — da “América para os americanos” e de um continente integrado — desapareceu. Na verdade, sempre existiram três Américas. Uma, a América do Norte, rica, saxônica, de onde saiu o grande país que dominava o mundo, liderando política e economicamente os países dos cinco continentes e disseminando as ideias de Continue a ler
Não há palavra mais usada e gasta no vocabulário político do que reforma. Quando as coisas precisam mudar e parecem gastas o caminho a que se lança mão é o apelo a reforma. Vem do Império o primeiro chamado forte a ela, para conjurar a República que já surgia. E veio do conselheiro Nabuco de Araújo, conservador que se tornou liberal e bradou, num momento de grandes dificuldades: “OU A REFORMA OU A REVOLUÇÃO!” Dizia que se não se fizesse uma grande reforma no sistema político inevitavelmente viria a revolução. Continue a ler
Todos sabem que sempre fui um crítico da Constituição de 1988, mas reconhecendo que o capítulo dos direitos individuais e os dispositivos que tratam dos direitos sociais são muito bons e expressam uma constituição moderna e atualizada. Quando convoquei a Constituinte, disse que devíamos aproveitar a oportunidade para fazer um Carta moderna que servisse de exemplo ao mundo, introduzindo os direitos sociais — já que o peleguismo getuliano tinha prejudicado a visão entre o capital e o trabalho —, buscando um capitalismo moderno. Mas apenas a partir das greves de Continue a ler
Hiroshima é uma mancha indelével na História americana. Agora surgiu outra: Trump comandando uma horda de apátridas, acabando com o que os Estados Unidos tinham como sua mais sagrada instituição, o American Dream, o sonho que fascinou a humanidade e os fez conquistar o mundo. O sonho de construir um mundo de liberdade, cujos fundamentos constam da Declaração de Independência, quando os pais fundadores fizeram a sua Tábua da Lei, como a maneira de construir a Democracia: “Consideramos estas verdades como evidentes, que todos os homens são criados iguais, que Continue a ler
É difícil para nós entendermos o sistema eleitoral americano. Estamos a cinco dias das suas eleições. A grande diferença para o sistema brasileiro é que aqui as regras eleitorais são federais, lá são federais e estaduais. Cada Estado tem independência para fazer seu sistema de votação como quiser. Apenas devem respeitar o que a Constituição regulou: primeiro, o presidente é eleito por um colégio eleitoral, numa tentativa de equilibrar os grandes e pequenos estados; segundo, cada estado elegerá dois senadores e tantos deputados quanto 1/435 da população total do país. Continue a ler
Costumo dizer que não estamos vivendo em um mundo em transformação, mas num mundo transformado. Com o Covid-19 especula-se que vamos viver um novo normal. Ninguém pode dizer o que isto será. Mas antes que ele venha estou estupefato diante de algo que jamais pensei que pudesse ver. A minha admiração pelos Estados Unidos vem do orgulho de que tenha saído do Continente Americano o país que transformou o mundo, tornando-se a maior nação da terra, líder e exemplo para todos os povos. Deles surgiu o sistema político que Fukuyama Continue a ler
O poder e a caneta têm uma relação íntima, às vezes libertina. Mas ultimamente ela tem sido explícita. A primeira vez que ouvi uma definição precisa sobre essa relação foi, nos longínquos anos de 1968, de Plácido Castelo, ele governador do Ceará, eu do Maranhão. Disse-me, mostrando uma caneta: “Sarney, nós, governadores, com esta bichinha poderosa, podemos fazer a felicidade e a infelicidade, nomear, demitir e ameaçar. Mas ela tem um defeito. Quanto acaba a tinta, não serve para mais nada.” A tinta acabava com a eleição do sucessor. A Continue a ler
O Estado de Direito Estudo publicado, em dezembro de 2019, em Emenda Constitucional nº 45/2004: 15 anos do novo Poder Judiciário, coletânea organizada pelo Presidente do Supremo Tribunal Federal. Ao se completarem 15 anos da Emenda Constitucional 45 — chamada de Reforma do Judiciário —, talvez a mais importante das mais de cem emendas à Constituição de 1988, a data é comemorada sem que o País tenha resolvido os mais urgentes e graves problemas da Justiça, sempre presentes em nossa História, desde D. João VI até os dias de Continue a ler
Colégio do México, Cidade do México, México, 18 de agosto de 1987 Templo maior da inteligência latino-americana, com quase meio século de existência, este colégio continua sendo único e exemplar como centro de pesquisa e como Assembleia de grandes professores em humanidades e ciências sociais. Fundado sob a dupla égide da história e do humanismo, graças ao fecundo trabalho de Cossío Villegas e Alfonso Reyes, soube sobreviver a todas as transformações por que passou a estrutura universitária em nosso continente. Seu estado e vocação — a primazia da pesquisa conduzida Continue a ler
Nações Unidas, Nova Iorque, EUA, 25 de setembro de 1989 Abertura da 44a Assembleia Geral da ONU Senhor Presidente, Senhores Delegados, Apresento a Vossa Excelência meus cumprimentos pela sua eleição. Temos certeza de que sua experiência assegura a nossos trabalhos um caminho firme e construtivo. Estendo minhas congratulações a seu ilustre antecessor. Registro, mais uma vez, o reconhecimento do Brasil ao Secretário-Geral Perez de Cuéllar. Quero, ao iniciar este discurso, prestar a minha homenagem e reverência ao povo da Colômbia e ao Presidente Virgílio Barco, pelo exemplo de coragem cívica Continue a ler
Buenos Aires, Argentina, 29 de novembro de 1988 Hoje é um dia marcante na história do nosso continente. Um passo fundamental, que será lembrado como uma mudança extraordinária, em busca da independência econômica da América Latina e como uma prova de grande maturidade política. O Tratado de Integração, Cooperação e Desenvolvimento, que acabamos de assinar, incorpora-se à história do Brasil e da Argentina. É um marco. Representa uma etapa decisiva em nosso destino comum. Nossa vontade política foi capaz de superar obstáculos, vencer preconceitos, abrir a grande estrada do Continue a ler
Plenário das Nações Unidas, Nova Iorque, EUA, 23 de setembro de 1985 Abertura dos Debates da Assembleia Geral da ONU Esta tribuna impõe respeito e dignidade. É a mais alta na comunidade das nações, onde grandes e pequenos ficam menores, porque maior é a carga da história do gênero humano exercida pela tarefa que é o barro do seu trabalho — a paz —, pelos problemas que a desafiam, pelo esforço de transformar discordâncias em solidariedade. Há quarenta anos tem o meu País, o Brasil, o privilégio de abrir o Continue a ler
Senado Federal, Brasília, DF, 2 de março de 2006 Ocupo a tribuna nesta tarde para recordar que no dia 28 de fevereiro de 1986, portanto há 20 anos, foi editado o Plano Cruzado, que considero uma das mais importantes e corajosas medidas tomadas no Brasil para proteger os pobres e o povo brasileiro. Quando assumi a Presidência, a nossa economia estava numa situação extremamente difícil. Recebemos um deficit de 60% do nosso orçamento. Hoje, fala-se num deficit de 4% e até de superavit. Pode-se, então, avaliar o que era. A Continue a ler
Senado Federal, Brasília, DF, 1o de fevereiro de 1995 Senhoras e Senhores Senadores, estou aqui com os mesmos sonhos com que cheguei pela primeira vez à Câmara dos Deputados em 1955. Tendo ocupado todos os cargos públicos do País, jamais, depois de trinta anos de mandatos legislativos, aceitei participar da direção dos nossos trabalhos. Peço-lhes licença para invocar, como aval do compromisso que assumo com a Casa, a legitimidade que tenho para presidi-la. Deputado Federal três vezes, três vezes Senador da República, Vice-Presidente e Presidente da República, estou assumindo esta Continue a ler
Congresso Nacional, Brasília, DF, 15 de fevereiro de 1990 Senhores Congressistas, Envio ao Congresso Nacional a última mensagem do meu mandato. Renovo, mais uma vez, minha homenagem a esta instituição, coração e alma do sistema democrático. Lanço os olhos no tempo. Recordo a manhã de 15 de março de 1985. Com a doença, e depois a morte de Tancredo Neves, coube-me dirigir a Nação no seu período mais difícil, porque mais cheio de cobranças políticas, em toda a nossa História. Somavam-se esperanças e dificuldades. As liberdades, até então represadas, explodiam Continue a ler