Antônio Paulino Limpo de Abreu, Visconde de Abaeté, foi senador por 36 anos. Quando eleito, em 1847, fora juiz, ouvidor, desembargador, Ministro do Supremo Tribunal de Justiça, deputado, Presidente da Câmara dos Deputados, Presidente da Província de Minas Gerais, membro do Conselho de Estado, oito vezes ministro — depois foi mais cinco vezes ministro, além de Presidente do Conselho de Ministros. Depois presidiu o Senado do Império por doze anos.
O velho Senado era diferente, conta Machado de Assis: “Nenhum tumulto nas sessões. A atenção era grande e constante. […] mui excepcionalmente, eram admitidos ouvintes no próprio salão do Senado, como aliás era comum na Câmara temporária; como nesta, porém, os espectadores não intervinham com aplausos nas discussões. A presidência de Abaeté redobrou a disciplina do regimento.”
Abaeté foi liberal e, depois de participar do Gabinete da Conciliação, tornou-se conservador. Visitava todo dia a Nabuco de Araújo, seu vizinho, a quem chamava de “mestre da lei”. Conta Joaquim Nabuco: era “preciso, meticuloso na expressão, apurando rigorosamente cada minudência, quer se tratasse de um projeto de lei quer de um cumprimento ao Imperador, sarcástico sem ser ofensivo, procurando a correção em tudo.” Nabuco registra um bilhete do pai, de 1874: “O nosso Abaeté apareceu outra vez em cena com o brilhantismo da juventude e logo lhe entreguei o bastão de chefe.” Retornava ao Partido Liberal, quando muitos já se bandeavam para as ideias republicanas.
Ao Senado vitalício chegava-se, como Abaeté, já com uma carreira feita. Nem por isso a Casa levava menos a sério suas tarefas. Machado: “Os senadores compareciam regularmente ao trabalho. Era raro não haver sessão por falta de quorum.” “…certo que a vitaliciedade dava àquela casa uma consciência de duração perpétua, que parecia ler-se no rosto e no trato de seus membros. […] Já então se evocavam contra a vitaliciedade do Senado os princípios liberais como se fizera antes. Algumas vozes vibrantes cá fora, calavam-se lá dentro, é certo, mas o gérmen da reforma ia ficando, os programas o acolhiam, e, como em vários outros casos, os sucessos o fizeram lei.”
Capistrano de Abreu afirmava que ao Senado Vitalício e ao Poder Moderador devemos a unidade nacional e a construção do Brasil. Extinto o Poder Moderador, coube ao Senado Federal o papel de centro de equilíbrio do País. Ambos tinham como base o pensamento de Benjamin Constant, que chamava o Senado de “casa da duração”, onde existe a ideia da perenidade, da estabilidade. É a Casa do equilíbrio, porque há, vinda do velho Senado, a noção de permanência, de que não é uma Casa transitória. Cabe-lhe na República equilibrar a Federação, fixando-se para isso em três o número de Senadores de cada Estado — quando antes era de metade dos Deputados de cada Província. Essa igualdade de representação fez com que, no já distante ano de 1959, eu sustentasse no Parlamento que seria um atentado ao sistema representativo a introdução de cadeira vitalícia para ex-presidentes da República. É com a representação paritária que o Senado evita que os estados menores sejam massacrados pela junção dos maiores, daí porque cada lei que ali é votada representa os interesses de todos.
Como na Constituição americana, já não mais os senadores têm mandato vitalício. Mas também na República o normal é que a Casa seja constituída de políticos com grande experiência — tendo sido governadores, ministros de Estado, deputados de múltiplos mandatos — e que do Senado saiam, com frequência, presidentes da República — quase metade destes foram senadores.
A grande missão do Senado é legislar. Mas não se esgota no legislar sua missão. É uma Casa em que o debate dos problemas nacionais permite encontrar soluções, propor diagnósticos, propugnar políticas.
Diz Nabuco de Abaeté: “A consideração, a posição, o respeito bastam-lhe inteiramente; o poder não o tenta.” E transmite a frase do pai: “O Senado não faz política.” Se referia, é claro, à política de interesses pessoais ou partidários. Esses são os paradigmas que devem orientar o Senado.