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A Palavra do Sarney

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Darcy Ribeiro: sobre “O Dono do Mar”

  Uma leitura gozosa Li O Dono do Mar e gostei. Muito. Não imaginava José Sarney um romancista poderoso. E é. Entra no livro nadando de braçadas, dono das águas, dos ares e dos mares do Maranhão. Dá voz e alma aos pescadores das ilhas e das praias de São Luís com sabedoria e volúpia exemplares. Sarney é o intérprete de uma das matrizes básicas da cultura brasileira, a dos pescadores. Equivalente ao que Zé Lins é para o povo dos engenhos e Jorge Amado, para o gentio dos cacauais. Continue a ler

Antônio Olinto: sobre “O Dono do Mar”

  Personagens vivos e fortes Pouco sabemos dos mistérios da criação literária. Como de qualquer outra criação. Explicações técnicas, temo-as aos montes. Análises sintáticas, melódicas, biológicas, sociais, ou puramente vocabulares, ou sociológicas, psicanalíticas, ou simplesmente ligadas ao adjetivo do momento. Algumas em separado e todas em conjunto, aclaram meandros, facilitam visões particulares, embora possam deixar um lado lunar inatingível. Esses estudos de decomposição revelam às vezes desconhecimento do fenômeno da composição. A autópsia mostra, mas não surpreende a vida em ação. Fica faltando, ao analista puro, uma intimidade maior com Continue a ler

Gerard de Cortanze: sobre “O Dono do Mar”

  Homenagem às gentes do mar O mar do Maranhão, no Norte do Brasil, é um cenário cheio de mistérios. Ao longo de um litoral muito recortado, muitas águas embaralham suas correntes. Ao longo de suas baías ricas de uma fauna e uma flora luxuriantes, bancos de areia, canais, manguezais, atóis, barreiras de coral, baixios constituem um universo geográfico onde nascem e se propagam as lendas mais singulares. Há muitas gerações os pescadores desta zona setentrional do Brasil, nas margens de suas bianas e de seus igarités, reencontram um oceano Continue a ler

Léo Gilson Ribeiro: sobre “Norte das Águas”

  O Maranhão do senador Sarney, o escritor Em São Luís do Maranhão, no palácio dos Leões, quando termina o expediente diário, é comum ressoarem pelas janelas abertas para o azulão rio Anil vozes de cantadores populares ao som de violas. Modinhas que falam de filhas de fazendeiros seduzidas, de coronéis do interior em luta eleitoral e de cangaceiros valentes partindo do palácio do governador estadual. Para o povo do Maranhão, essas melodias fazem parte do encerramento dos trabalhos, quase que se casam com o lento crepúsculo da cidade, com Continue a ler

Lincoln Paine: sobre “O Dono do Mar”

  Literatura do Mar e História Marítima Na obra de José Sarney, O Dono do Mar, o pescador Antão Cristório tem como companheiro Aquimundo, encarnação de um piloto chamado Aires Fernandes que morreu afogado, e “em quem o tempo não passou”. Aquimundo conta ao perplexo Cristório, no seu primeiro encontro: Andei por muitas terras, de Sofala, Querimba, Ibo, Pemba, Mombaça, Melinde, Pate, Ormuz, Diu, Goa, Coxim, Malaca, Ceilão, Meliapor, Macau, Timor, e cheguei a Nagasáqui com Francisco Xavier, o padre que hoje é santo, mas que embarcou comigo na nau Continue a ler

José Louzeiro: sobre “Saraminda”

  A importância de Saraminda O mais recente romance de José Sarney, que vem sensibilizando leitores e críticos, é uma obra inovadora. São quatro as trilhas e tramas que dinamizam essa narrativa: — O erótico, de desenho quase litúrgico, elevado ao estágio do sutil; — A instauração de um ciclo especial do inferno chamado garimpo; — Os duendes da mata-virgem que se tornaram anjos protetores  inclusive do romancista; — O passado que condena mas enternece. Saraminda não é apenas um contraponto de Iracema e Capitu, como lembra Carlos Heitor Cony. Continue a ler

Tereza Cruvinel: sobre “Saraminda”

  Era uma vez uma mulher de seios de ouro   No novo livro de Sarney, há pitadas de realismo fantástico colhidas no imaginário dos garimpos e na tradição oral. A literatura ficará devendo à política a existência de Saraminda, o novo romance de José Sarney. Não fosse haver-se candidatado a uma cadeira do Senado pelo Estado do Amapá em 1991, não teria o ex-Presidente tropeçado nas sobrevivências da luta entre franceses e brasileiros pela posse das terras contestadas, ou nas marcas da febre de ouro que rasgou o ventre Continue a ler

Radu Vladut: sobre “Saraminda”

  Saraminda, a fascinação do inefável Além de suas virtudes literárias certas, Saraminda é um romance de grande atmosfera, na linha trilhada há mais de meio século por Malcolm Lowry com Under the Volcano, cuja ação tem lugar nas mesmas coordenadas geográficas (aproximadamente). Difícil de construir e com um alvo relativamente restrito, tal romance solicita ao máximo o leitor, impondo geralmente uma segunda e até uma terceira leitura para atingir a decifração do ambiente, principalmente, e da linha épica, secundariamente. As personagens, porém, precisam antes de uma abordagem permitida mais Continue a ler

Carlos Zarur: sobre “Crônicas do Brasil contemporâneo”

  As Crônicas de Sarney Acabo de ler as Crônicas do Brasil contemporâneo do jornalista, escritor, intelectual, cronista e, também, político, José Sarney. Um atento olhar sobre a realidade nos artigos que foram publicados na Folha de São Paulo entre os anos de 1988 e 2002. O estilo, quase sempre sereno como o autor, pode, repentinamente, cortar como navalha aprofundando a discussão de delicados problemas. Logo no início, é importante a constatação crítica de que “a arte da política, com P grande, vai se tornando difícil”. O autor lembra que Continue a ler

Antônio Carlos Villaça: sobre “Norte das Águas”

  Sem pão e sem medo Norte das Águas, de José Sarney, apareceu em 1970. Guimarães Rosa morrera em novembro de 1967. José Cândido de Carvalho publicara O Coronel e o Lobisomem, em 1964. Josué Montello disse muito bem que José Sarney está para o Maranhão como Simões Lopes Neto está para o Rio Grande do Sul e o primeiro Afonso Arinos está para Minas Gerais. Entenda-se. A pura identificação do escritor com a sua terra, com o seu povo. O Maranhão é a matéria e o sentido da sua Continue a ler

Josué Montello: sobre “Norte das Águas”

        Norte das Águas O autor deste livro conquistou renome internacional na vida pública brasileira — primeiro, como deputado federal, em seguida como governador do seu estado natal, o Maranhão; mais tarde, como senador, presidente da Arena e do PDS. Ou seja, um líder político indiscutível. Se José Sarney não tivesse escolhido o caminho político para conseguir destaque no plano nacional, poderia ter feito isso, e bem antes, no campo da literatura, com sua pena de grande escritor. O que este livro de contos regionais vem comprovar. Continue a ler

Lago Burnett: sobre “Norte das Águas”

  Um Político no Reino da Fábula As inevitáveis comparações entre o escritor e o político que coabitam numa personalidade complexa como a de José Sarney convergem sistematicamente para um julgamento apoiado em padrões convencionais de competitividade: a consagração de um e a condenação do outro. Essa relutância em aceitar que político e escritor se completam, vem postergando uma definição em torno da obra que José Sarney realiza simultaneamente na vida pública como no âmbito literário. Aos que ainda cultivam a superstição de que a literatura enfraquece a atividade política, Continue a ler

Lucy Teixeira: sobre “Norte das Águas”

    Intenso lirismo As histórias que o escritor José Sarney reuniu em seu livro de estreia, Norte das Águas, serão aqui examinadas no sentido de relevar-se a consequência ficcional do livro e sua intenção narrativa. Por outro lado, ao situar sua presença dentro do regionalismo nacional, seremos tentados a fazer uma leitura crítica de Os Boastardes (segunda história  e o Norte das Águas) à maneira de Northrop Frye, tão visíveis para nós são certos arquétipos psicológicos e a presença de uma alegoria que conquistam sem dúvida para o livro Continue a ler

Luiz Gutemberg: sobre “Conversa ao Pé do Rádio”

  Conversa ao Pé do Rádio Todas as sextas-feiras, às 6 horas da manhã, infalivelmente, desde 25 de outubro de 1985, o presidente da República saudava “brasileiras e brasileiros”, dava-lhes “bom dia” e anunciava ele mesmo estar começando mais uma “conversa ao pé do rádio”. Aconteceu, às vezes, de ele lembrar que falava de Moscou, Buenos Aires, Paris, Washington, São Luís do Maranhão, São Paulo ou de uma remota fronteira da Amazônia. Se por acaso coincidisse de o presidente ter viajado para algum desses lugares, a “Conversa ao pé do Continue a ler

Ferreira Gullar: sobre “O Dono do Mar”

  Abismos do mar e da alma humana Acabo de ler O Dono do Mar de enfiada, interrompendo quando obrigado, mas voltando a ele sempre com interesse. No começo, tive a impressão de que parecia com o rio do romance poético de Jorge Amado, porém essa impressão se desfez ao prosseguir na leitura. É uma coisa de Sarney, do Maranhão, de São Luís. Sem dúvida se trata de um romance poético, mas com tom próprio e que nasce de uma experiência de vida e não de leituras literárias. Além disso, Continue a ler

Carlos Nejar: sobre “O Dono do Mar”

  São as palavras que velejam O tirocínio de político e estadista do ex-Presidente e Senador José Sarney tem longa e rica trajetória na vida brasileira e, como todos, sofre a justa depuração do tempo. Mas escrevo sobre o ficcionista José Sarney. Recentemente, em Buenos Aires, quando o jornal La Prensa, um dos periódicos importantes da Argentina, fez uma reportagem a respeito de seu novo livro, O Dono do Mar, e me perguntou o que achava desse ficcionista maranhense, não tive dúvida de falar de minha admiração por sua obra-prima, Continue a ler

Josué Montello: sobre “O Dono do Mar”

  No tom das obras definitivas O presidente José Sarney, não obstante os muitos caminhos de sua vida pública — que o trouxeram da província natal para a Presidência da República, e daí para a Presidência do Congresso — continua fiel à sua vocação de escritor. Foi essa vocação que o levou à Academia Brasileira, para suceder a José Américo de Almeida, também político e homem de letras, ambos fiéis ao chão de suas origens, sem deixar de serem grandes nomes nacionais, profundamente identificados com a realidade brasileira. A condição Continue a ler

Éris Antônio Oliveira: sobre “O Dono do Mar”

  Sortilégios da noite em O Dono do Mar A elaboração ficcional de O Dono do Mar oferece uma percepção diferenciada da realidade, permitindo que os procedimentos inventivos da imaginação integrem-se plenamente à essência transfiguradora de sua ousada composição. Seu projeto formativo coloca em evidência a postulação aristotélica, segundo a qual “o papel do ficcionista consiste em dizer não o que ocorreu realmente, mas o que poderia ter ocorrido na ordem do verossímil ou do necessário”. (Aristóteles, 1966, p. 36) Nessa perspectiva, seus constituintes estruturais possibilitam ao leitor inserir-se, inteiramente, Continue a ler

Claude Couffon: sobre “Saraminda”

  Jogo da memória e da sedução Hei-nos transportados ao coração de uma Guiana decadente que “vegeta na miséria da canela e paus-de-tinta”, há mais de um século, depois em algum lugar entre o Oiapoque e o estuário do Amazonas, sobre um território contestado entre a França e o Brasil, um episódio hoje um tanto esquecido. Mas a História não aparece senão em filigranas numa narração consagrada à loucura dos garimpeiros. É a aventura de cada personagem que retraça o destino fabuloso e lamentável da república fantasma do Cunani, nascida Continue a ler

Alexandre Fillon: sobre “Saraminda”

  E não restará mais do que pó Presidente do Brasil de 1985 a 1990, José Sarney possui uma segunda corda no seu arco, a de romancista. Ex-presidente da República Federativa do Brasil de 1985 a 1990, José Sarney é atualmente senador eleito até 2007 em seu país, onde também integra a Academia Brasileira de Letras. Nascido em 1930, esse senhor escreveu uma vintena de obras, da poesia ao ensaio, passando pelo romance. Na França pode-se descobrir algumas facetas de seu talento, graças às traduções Au-delà des fleuves (Stock, 1988) Continue a ler

Maurice Pianzola: sobre “O Dono do Mar”

  O sórdido e o maravilhoso Fiquei tocado pela faculdade de José Sarney de descrever a vida popular, de fazer caminhar lado a lado o sórdido e o maravilhoso. Isso se traduz naturalmente em sua linguagem, ainda mais aqui que em O Dono do Mar, quando Sarney atravessa a fronteira do Brasil para penetrar na Guiana Francesa, particularmente desconhecida da literatura francesa, de  onde conhecemos apenas algumas reportagens sobre a prisão de Caiena. A isso se junta o fato de seu realismo ir na contra-corrente de uma certa decadência da Continue a ler

Alfredo Fressia

  Diálogo universal da condição humana Começar uma novela com um sonoro insulto “Capitão?, Capitão é a puta que o pariu” pode não ser tão original na literatura latino-americana, desde o chamado boom. Mas que o insulto venha seguido pela contida emoção do relato de um padre que lava e prepara o corpo do filho assassinado, com o infinito amor paterno, criado a partir de cada detalhe desse corpo lentamente lavado, isso sim é literalmente audaz. O Capitão, “título dado pelo mar”, que não aceita ser chamado assim às sextas-feiras, Continue a ler

Alfredo Fressia

  Sarney, a selva alucinada Devo confessar: não sei ler a obra narrativa de um político profissional com a inocência, com a devida “suspensão voluntária do descrédito”, que Coleridge pedia ao leitor. Ao contrário, trata-se sempre de uma leitura instalada em uma zona rarefeita de poderes: ao poder que exerce todo narrador, esse pequeno deus que cria mundos com a palavra, agregam-se outros, espúrios, literariamente pouco solidários, que emanam do exercício político e decisório, de uma biografia autoral crispada por simpatias ou por ódios e até de um quase inevitável Continue a ler

Gregory Rabassa

  Saraminda No momento, estou trabalhando no segundo romance de Sarney, Saraminda, que é bem diferente do primeiro e trata da corrida do ouro na região fronteiriça entre o Brasil e a Guiana Francesa, uma área que já foi disputada pelos dois países. Se O Dono do Mar me fazia trabalhar em busca dos equivalentes para termos de pesca e marítimos, agora fico alerta para aqueles referentes à prospecção e ao garimpo de ouro. Saraminda é o nome de uma garota créole da Guiana Francesa, trazida para os garimpos de Continue a ler

Primeira Idade

Norberto Bobbio, o grande cientista político italiano, já perto de completar cem anos, perguntado sobre a velhice, respondeu: “A velhice é muito boa, só tem um defeito, dura pouco.” Agora, muita gente me tem feito a mesma pergunta. Eu digo que não sei, porque não sou velho; sou às vezes um adolescente, outras vezes um adulto curioso. Continuo estudando muito, lendo e trabalhando. Magalhães Pinto me dizia que “velho é quem tem um ano mais do que eu”. Quase o que repetia o meu avô Assuéro, pai de minha mãe Continue a ler

Política x Ciência

Há agora uma novidade na discussão política brasileira. Sumiu a controvérsia e discussão sobre os ismos (comunismo, fascismo, populismo etc.) para, diante da catástrofe do Coronavírus, surgir o grupo dos adeptos dos cientifistas e dos guedistas, ou seja, dos que querem seguir o que determina a OMS (Organização Mundial de Saúde) com o isolamento e daqueles que querem ver o libera geral: todos comprando porque a economia está acima da ciência, isto é, da vida. O que se discute não é racional. O que está ameaçado não é a economia, Continue a ler

Nostradamus e o Corona

Acho que todos nós a quem Deus deu a graça da vida já passamos muitas vezes pelo anúncio de que o mundo ia acabar. Algumas vezes marcavam data, outras vezes invocavam as profecias de Nostradamus ou de outros profetas menos votados. Nostradamus desde 1555, quando escreveu seu livro Profecias, assusta a humanidade. Dizem que previu a Revolução Francesa, Hitler, a tragédia das Torres Gêmeas de Nova Iorque e, agora para 2020, como todos os anos, furações, tempestades, enchentes, a deposição de Kim Jong Il (Deus queira que se realize), um Continue a ler

Além da literatura e da política

Sempre tive febre de conhecimento. Talvez uma Enciclopédia Popular que meu avô José Adriano, professor — “mestre escola”, como assim se chamava naquele tempo, em São Bento, onde passei a minha infância —, me tenha despertado essa curiosidade. Na cidade nem na nossa casa não tínhamos livros para minha idade. Havia apenas o Almanaque de Bristol e essa Enciclopédia, que meu avô recebia mensamente, e era minha fonte de conhecimentos novos. Eu tinha uma grande pressa em esperá-la mensalmente. Daí meu hábito da leitura e a companhia do maior amigo Continue a ler

Claude Lévi-Strauss

  Incisiva e emocionante A Duquesa Vale uma Missa parece-me uma espécie de interlúdio na obra de José Sarney. Seu conhecimento do Nordeste e suas evocações cheias de lirismo dão lugar a uma intriga ora incisiva, ora emocionante, expressão simbólica de problemas contemporâneos. Mas, ao mesmo tempo, um motivo constante de sua obra se afirma aqui, que consiste, parece-me, na irrupção do passado no coração do presente. Essa leitura cativou-me.